50 Anos como Professor no Ensino Superior

Foi por volta desta época, o Outono (no Hemisfério Norte), no ano de 1971, que eu comecei a trabalhar no Ensino Superior. Não era ainda como Professor: era como Teaching Assistant do Prof. George H. Kehm, no Seminário Teológico Presbiteriano de Pittsburgh. O Prof. Kehm havia sido meu professor de Teologia Sistemática ao longo do meu Mestrado no Seminário (M.Div.). E ele me convidou para ser Teaching Assistant dele enquanto eu cursava o primeiro ano do Doutorado, mas ainda morando no Seminário, que me fez essa gentileza de deixar eu morar, sem pagar, num apartamento do campus. Como Teaching Assistant dele eu atendia alunos, conduzia discussões em grupo com seus alunos, e, algumas vezes, dava aula para ele. Lembro-me de ter dado uma aula sobre “A Análise de Argumentos Teológicos”, usando o livro de Stephen E. Toulmin, The Uses of Argument, e também uma aula sobre o Argumento Ontológico para a Existência de Deus, comparando os argumentos de Anselmo e Descartes.

Foi, provavelmente, no mês de Setembro de 1971 que eu comecei a trabalhar para o Seminário, e o fiz até a minha defesa de Tese de Doutorado, no ano seguinte, em 8 de Agosto de 1972. Fez, portanto, 50 anos, este ano de 2021, que esse memorável acontecimento teve lugar — em algum lugar do mês do meu aniversário.

Depois de ter defendido minha Tese de Doutorado, eu deveria, pelas condições impostas pelos vistos americanos, voltar para o Brasil. Meu saudoso orientador, William (Bill) Warren Bartley III, houve por bem fazer duas coisas inusitadas.

Em primeiro lugar, ele escreveu ao Ministério do Trabalho dos Estados Unidos, argumentando que seria importante, para o meu exercício da função de Professor Universitário no Brasil, que eu tivesse alguma experiência prática nessa função nos Estados Unidos. Para que isso pudesse acontecer, ele solicitou que o Ministério do Trabalho dos Estados Unidos argumentasse junto ao Ministério da Justiça, especificamente através do seu Departamento de Imigração e Naturalização, que o meu visto para permanência nos Estados Unidos fosse prorrogado por dois anos, para que eu pudesse trabalhar, assim adquirindo experiência prática, além de acadêmica, antes de retornar ao Brasil. E que me autorizasse a trabalhar, pois meu visto era de estudo, não de trabalho. Embora improvável, a coisa deu certo e meu visto de permanência nos Estados Unidos foi prorrogado por dois anos e eu recebi autorização para trabalhar normalmente no mundo acadêmico.

Em segundo lugar, faltava arrumar o trabalho que eu faria… Através de contatos dele, e ele tinha uma network fantástica, Bill Bartley descobriu que duas universidades na California, uma a Universidade Estadual da Califórnia, em Hayward, hoje designada como “em East Bay” (apesar de continuar no mesmíssimo lugar), porque se tornou uma importante instituição regional no lado leste da Baía de San Francisco, a outra o conjunto de “Colleges” Integrados de Claremont, ao qual pertencia o Pomona College, o mais antigo deles, iriam ter professores ausentes em sabático nos anos letivos de 1972-1973 e 1973-1974, exatamente os dois anos que eu estava autorizado a permanecer nos Estados Unidos para trabalhar, e agindo, por conta própria, Bill Bartley me arrumou esses dois empregos como Preletor, em Hayward, e como Professor Assistente Visitante, em Pomona. E em Junho de 1974 eu voltei ao Brasil, porque havia arrimado emprego na UNICAMP, onde comecei a trabalhar em Julho de 1974. E na UNICAMP trabalhei até Janeiro de 2007. Saindo da UNICAMP trabalhei por nove anos como Professor Colaborador na Pós-Graduação em Educação Comunitária do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL), Campus de Americana, até 2016, da qual era Coordenador meu orientando de Doutorado na UNICAMP, Renato Kraide Soffner. Durante os anos de Julho de 2014 a Junho de 2017 também trabalhei como Professor de História da Igreja e História do Pensamento Cristão na Faculdade de Teologia de São Paulo da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (FATIPI). (Curiosidade: meu orientador de Doutorado me arrumou dois empregos em série e um dos meus orientandos de Doutorado me arrumou outro, bem mais longo, agora aqui no Brasil.

Ou seja, de Setembro de 1971 a Julho de 2017, durante quarenta e seis anos, eu trabalhei no Ensino Superior, como Teaching Assistant, Lecturer, Visiting Assistant Professor, Professor Livre-Docente (UNICAMP, 1974-1977), Professor Adjunto (UNICAMP, 1977-1980), Professor Titular (UNICAMP, 1980-2017), Professor Colaborador (UNISAL), Professor (FATIPI). Fui ainda Professor Visitante na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), no Departamento de Informática, em 1987, por um semestre, a convite da Professora Tânia Campos, e na PUCCAMP, no Instituto de Informática, 1992-1997, neste caso a fim de criar e implantar o Mestrado Profissional em Gerenciamento de Sistemas de Informações, em companhia de meus colegas, todos devidamente autorizados pela UNICAMP, a pedido da PUCCAMP, Maurício Prates de Campos Filho (meu grande amigo, e companheiro de inúmeras batalhas na UNICAMP, já falecido) e Manuel de Jesus Mendes, português de nascimento, ambos da Faculdade de Engenharia da UNICAMP, o primeiro da Engenharia Mecânica, o segundo da Engenharia Elétrica.

Na Primavera (aqui no Hemisfério Sul) de 1971 começou, portanto, minha carreira de trabalho no Ensino Superior. Desde Julho de 2017 estou definitivamente aposentado. Mas comemoro, neste Dia do Professor, os 50 anos do início de minha carreira como professor. Deveria ser 49 anos, mas considero o ano como Teaching Assistant também como trabalho docente — afinal de contas, eu era TEACHING Assistant, não Research Assistant.

Parabéns a todos os colegas envolvidos nesta fascinante carreira, a de Professor, na área da Educação — fascinante, mas, de vez em quando, um pouco ingrata. Hoje é o Nosso Dia.

Em Salto, 15 de Outubro de 2021

Uma Breve Biografia – Atualizada

[Este artigo é uma versão revisada e atualizada de outro que escrevi com basicamente o mesmo título (sem o “Atualizada”, naturalmente), e que publiquei no meu blog Chaves Space em 5 de Julho deste ano de 2019, em https://chaves.space/2019/07/05/uma-breve-autobiografia/. Além de acrescentar vários materiais e várias informações, dividi o conteúdo em quinze partes. Ele será oportunamente inserido em uma autobiografia que estou escrevendo há muitos anos.]

= PARTE I =

Nasci em Lucélia, na na região que um dia foi chamada Alta Paulista, no interior do Estado de São Paulo, no dia 7 de Setembro de 1943. Celebrei este ano (2019) 76 anos de vida.

Meu pai, Oscar Chaves, ministro (pastor) Presbiteriano (pela Igreja Presbiteriana do Brasil), era pessoa conservadora e tradicional. Seu principal legado, no que me diz respeito, foi uma personalidade argumentativa e pugnaz, quase briguenta, e uma preocupação constante com a justificação e defesa de minhas convicções, meus valores, minhas atitudes e minhas ações.

Fiz o Primário e o Ginásio (que, juntos, compõem o que é hoje a Educação Fundamental) em Santo André, SP, respectivamente no Grupo Escolar “Prof. José Augusto de Azevedo Antunes”, na Rua Senador Flaquer, e no Colégio Estadual e Escola Normal “Dr. Américo Brasiliense” (depois chamado, enquanto eu ainda estudava lá, de Instituto de Educação “Dr. Américo Brasiliense”), na Praça do Quarto Centenário.

Depois de um ano desperdiçado no Colegial Científico do Américo Brasiliense (desisti na metade do ano), fui fazer o Colegial Clássico no Instituto “José Manuel da Conceição” (JMC), em Jandira, SP, uma escola-internato pertencente à Igreja Presbiteriana do Brasil, que foi fechada pela igreja em 1970 em circunstâncias não bem esclarecidas até hoje. (Havia, na época, o Colegial Clássico, o Colegial Científico e o Curso Normal. Eram equivalentes, do ponto de vista formal, ao Ensino Médio de hoje).

Naquela época a maior parte dos alunos do sexo masculino que estudavam no Instituto JMC tinha a intenção de seguir para um Seminário Teológico a fim de se preparar para o ministério (pastorado) evangélico. Eu não era exceção. Influenciado, em parte, pela história de meu pai (que também havia estudado no Instituto JMC, na década de 30, de 1934 a 1938), matriculei-me, em 1964, no Seminário Presbiteriano do Sul (SPS), também conhecido como Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana do Brasil, em Campinas, SP (onde meu pai também já havia estudado, de 1939 a 1941). Minha festa de calouro estava agendada para o fatídico 1º de Abril de 1964. É desnecessário acrescentar que (como muita coisa mais) foi abortada pelo Golpe Político-Civil-Militar de 31 de Março… Que houve um golpe, não tenho nenhuma dúvida; que foi exclusivamente militar, tenho certeza que não; que, com o golpe, tenha tido início uma ditadura, considero discutível: para mim a ditadura, propriamente dita, só teve início a partir do final de 1968, tendo a dita sido mais dura exatamente durante o governo do mais popular dos presidentes militares: Garrastazu Médici). A ditadura começou a ser  desconstruída com Geisel, o primeiro presidente protestante do Brasil, durante cujo governo a ditadura virou uma ditabranda, e terminou de ser até mesmo uma ditabranda com Figueiredo, a Anistia, e a eleição de Tancredo e, lastimavelmente, Sarney.)

Voltando a 1964 e ao Seminário, com uma ou duas exceções, o corpo docente do Seminário Presbiteriano de Campinas era muito conservador, tanto teológica quanto politicamente, e entre os alunos havia alguns (admitidamente, uma minoria) que chegavam a ser extremamente reacionários (novamente, tanto no plano teológico quanto no político). Sendo essa a situação, tive o que hoje, em retrospectiva, só posso considerar a sorte de ser expulso do Seminário em 1966, quando estava no meu terceiro ano, em virtude de basicamente duas razões:

  • a primeira, por defender teorias não muito ortodoxas acerca da religião e da teologia cristã, especialmente, no caso da religião, em geral, as do filósofo escocês David Hume, um cético que, para todos fins práticos, era um ateu, e, no caso da teologia cristã, as de Rudolf Bultmann, o último dos grandes teólogos liberais alemães do século 19, embora tivesse vivido sua vida profissional no século 20, em meio a teólogos suíços denominados neo-ortodoxos (Karl Barth e Emil Brunner), com os quais é indevidamente agrupado pela maioria dos historiadores;
  • a segunda,  por publicar, no jornal do Centro Acadêmico, do qual eu era editor, e que tinha o provocante nome de “O CAOS em Revista” (visto que o nome do Centro Acadêmico era “Oito de Setembro”, data da fundação do Seminário), uma crítica violenta aos professores do Seminário por sua atitude totalmente omissa na crítica a ideias fundamentalistas, e, depois, e por fazer uma defesa apaixonada, baseada no livro On Liberty, de John Stuart Mill, do direito à liberdade de pensamento e de expressão.

= PARTE II =

Faço um breve interlúdio aqui, quebrando o fluxo natural da narrativa, para explicar o meu love affair com Bultmann, mencionado na primeira das duas razões. Faço isso transcrevendo, nesta segunda parte, uma versão atualizada de um artigo que escrevi em 2014 e revi em 2015 e, agora, em 2019. Ela está publicada também em meu blog Autobio Space, em https://autobiospace.wordpress.com/2015/11/10/50-anos-atras-hoje-55/.

Estou lendo uma biografia de Rudolf Karl Bultmann. O título é Rudolf Bultmann: A Biography, e o autor é Konrad Hammamm. Estou lendo em um e-book comprado da Amazon Kindle.

Li Bultmann pela primeira vez há 50 anos. Em 1964 eu fui para o Seminário Presbiteriano de Campinas e lá fui apresentado a Bultmann. Não pelos professores: Bultmann era muito avançado e radical para eles. Foram os colegas que me apresentaram Bultmann: Waldir Berndt, Elias Abrahão… Principalmente eles. Foi o contato com Bultmann que começou a desestruturar a fé simples, não-refletida, ingênua, que eu havia trazido comigo para o seminário. Uma fé que se contentava consigo mesma, que se bastava a si mesma, que não buscava, como um dia sugeriu Santo Anselmo, o entendimento. Uma fé sem entender, que cria mesmo naquilo que não entendia.

O que os colegas me falavam sobre Bultmann despertou minha curiosidade. Acabei comprando um livro, em dois volumes, chamado Kerygma and Myth, editado por Hans Werner Bartsch, que começava com um artigo de Bultmann, com o título “The New Testament and Mythology” e trazia uma série de artigos que discutiam o artigo programático de Bultmann. Comecei a ler — e fiquei abalado. Fiquei em dúvida se deveria continuar lendo. Eu tinha apenas 20 anos, mas sabia que seria arriscado. Aquilo que eu já havia lido falava sobre questões acerca das quais eu nunca havia pensado, em minha santa ingenuidade de primeiro anista de seminário. Mas eu imediatamente percebi que o artigo de Bultmann era nitroglicerina pura. Se eu optasse por continuar a lê-lo, sabia que minha fé correria risco. Mas parar de ler não era mais uma opção. Li, então, até o fim. Era longo. E resolvi traduzir o artigo, oportunamente, para o Português. Fiz isso já no meu segundo ano de seminário, em 1965. O Setor de Apostilas do Centro Acadêmico “Oito de Setembro” (CAOS) publicou a tradução em apostila — usando estênceis (não sei se o termo stencils se traduz assim), daqueles velhos, encerados, e um mimeógrafo que era propriedade do CAOS. Eu mesmo digitei (datilografei) o texto nos estênceis. Publicado, interna corporis, sem pedir permissão a ninguém, o artigo causou furor. Ajudou preparar a crise do ano seguinte, 1966.

O que mais me causava surpresa no artigo de  Bultmann era o seguinte. Se ele tivesse sido escrito por um ateu, o impacto em mim não teria sido tão grande. De um ateu você normalmente não esp5era grande coisa (pelo menos assim pensava eu em 1964). Na verdade, você até mesmo espera que ele critique sua religião. Mas Bultmann era “crente”. Mais do que isso: era pastor luterano – e teólogo, um dos mais famosos do mundo protestante, professor de teologia numa das mais conceituadas universidades mundiais: Marburg, na Alemanha. Havia livro com sermões dele… O exemplo dele falou tanto quanto seu artigo. Levou-me a crer que era possível defender as ideias que Bultmann defendia no artigo e continuar a ser crente, pastor, teólogo, professor de teologia (como eu pretendia vir a ser… — e, um dia, 50 anos depois, acabei sendo, na Faculdade de Teologia de São Paulo (FATIPI) da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (IPIB), em Julho de 1974.

Talvez eu mantivesse, ao acreditar nisso, um pouco da minha ingenuidade. Quem sabe era possível acreditar naquilo que Bultmann dizia e continuar a ser crente e pastor na Alemanha, país avançado… Mas, na Igreja Presbiteriana, aqui do Brasil, não seria. E não foi. Fui defenestrado do seminário em 1966. Em parte por causa de minha propaganda das ideias bultmannianas.

Mas fui parar, intermediariamente, na Faculdade de Teologia da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), em São Leopoldo. Lá vi que luteranos se entendem. Bultmann lá não era escândalo: era normal. Aos poucos eu comecei a conviver com as ideias de Bultmann como se fosse normal olhar para a Bíblia, Jesus Cristo, a sua apregoada ressurreição, e o Cristianismo daquele jeito…

Começava meu exílio da fé, que durou cerca de 45 anos.

Agora estou aqui, de volta, lendo uma biografia de Bultmann, 50 anos depois. Descubro, na biografia, que ele também enfrentou problemas por causa de suas ideias. Sofreu oposição. Universidades, como a de Leipzig, o convidaram para se transferir para seu Departamento de Teologia, como professor e parte do corpo docente, apenas para, depois, retirar o convite por pressão da Igreja Luterana… a mesma que, em grande medida, apoiou, logo depois, Hitler e o Nacional Socialismo. Senti-me mais irmanado a Bultmann ao descobrir isso. A igreja luterana alemã apoiou, em grande medida, o Nazismo — e a igreja presbiteriana brasileira apoiou, em grande medida, a Ditadura Militar brasileira…

Os livros de e sobre Bultmann que comprei nos anos 60 e 70 do século passado — são uns cinquenta — ainda os possuo, todos eles: nunca achei que devia me livrar deles. Eles eram — e continuam sendo — parte de mim. Dispor deles era como me livrar de um pedaço de mim. Não do meu corpo, mas da minha alma. As ideias deles entraram pelo meu sistema de ideias, foram mastigadas, algumas mal, outras melhor, mas foram todas de alguma forma digeridas, e, depois, algumas ficaram no sistema, outras foram excretadas, mas as que ficaram se misturaram com o que já estava no meu sistema e passaram a fazer parte de mim, parte do meu DNA. . .

Bultmann morreu em Julho de 1976, quando eu já era Diretor Associado da Faculdade de Educação da UNICAMP e pensava que havia deixado a teologia definitivamente para trás. Mais um engano meu. Autoengano.

[Este artigo foi originalmente publicado em meu blog Liberal Space, em Salto, no dia 23 de Agosto de 2014, poucas semanas depois de eu começar a dar aula de História da Igreja e de Teologia Histórica (História do Pensamento Cristão) na FATIPI. Fiquei lá durante três anos, saindo depois que me mudei de São Paulo para Salto. Foi revisto e transcrito no meu blog Autobio Space, em São Paulo, no dia 9 de Novembro de 2015. Mais uma vez revisto, é republicado aqui neste meu flagship blog, Chaves Space, em São Paulo, no dia 5 de Julho de 2019, ainda com o título original: “Uma Breve Autobiografia”. Republico-o, aqui, no mesmo blog, no dia 16 de Dezembro de 2019, 55 anos depois dos fatos que descrevo, com algumas alterações, e dentro de um contexto mais amplo, o de uma “Uma Breve Autobiografia – Atualizada”.

= PARTE III =

Continuo o meu interlúdio aqui, para discorrer sobre o affair que foi desencadeado por minhas críticas aos meus professores no Seminário Presbiteriano de Campinas, em 1966, mencionado atrás na segunda das duas razões. Aqui não vou narrar os fatos em detalhe, porque eles já estão narrados em outros artigos nos meus blogs.

Vide, portanto, a propósito da segunda das duas razões mencionadas, os seguintes artigos:

  • “Editorial” (Março 1966)
  • “Instituto Bíblico em Campinas” (Março 1966)
  • “Editorial: Ainda Jonas” (Abril 1966)
  • “Editorial” (Maio 1966)
  • “Parafraseando” (Maio 1966)
  • “Editorial” (Junho 1966)
  • “Editorial” (Agosto 1966)

Os dois primeiros artigos estão inseridos (em meio a um histórico) em meu artigo maior, de 2006, “Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (I)”, no meu blog Liberal Space, em https://liberal.space/2006/09/08/quarenta-anos-depois-do-caos-1966-2006-i/.

O terceiro artigo está inserido  (também em meio a um histórico) em meu artigo maior, de 2006, “Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (II)”, no meu blog Liberal Space, em https://liberal.space/2006/09/08/quarenta-anos-depois-do-caos-1966-2006-ii/.

Os quatro últimos artigos estão inseridos  (sempre em meio a um histórico) em meu artigo maior, de 2006, “Quarenta anos depois do CAOS: 1966-2006 (III)”, no meu blog Liberal Space, em https://liberal.space/2006/09/08/quarenta-anos-depois-do-caos-1966-2006-iii/.

Quem desejar ler esses três artigos maiores em uma só peça pode ler o artigo “Quarenta Anos depois do CAOS (1966-2006)”, que eu publiquei, em 2015, no meu blog Autobio Space, em https://autobiospace.wordpress.com/2015/11/07/quarenta-anos-depois-do-caos-1966-2006/.

Se preferir apenas os artigos de 1966, sem o histórico e os comentários acrescentados em 2006, pode consultar o artigo, “O CAOS em Revista”: Editoriais e Artigos de 18-3-1966 a 18-8-1966 (alguns censurados)”, que eu publiquei, em 2015, no meu blog Autobio Space, em https://autobiospace.wordpress.com/2015/11/07/o-caos-em-revista-editoriais-e-artigos-de-18-3-1966-a-18-8-1966-alguns-censurados/.

As cinco primeiras peças chegaram a ser publicadas em papel e distribuídas em 1966, mas as edições foram imediatamente confiscadas pela Reitoria; no caso das outras duas, a Congregação do Seminário havia instituído a censura prévia e as peças foram confiscadas antes mesmo de serem publicadas. Na verdade, o jornal inteiro de Junho de 1966 foi censurado. Minha carreira de jornalista foi, portanto, abruptamente interrompida sem que sequer uma das peças que escrevi tivesse sido normalmente distribuída.

Todo esse episódio está descrito em mais detalhe no artigo “Quarenta Anos depois do CAOS: 1966-2006”, mencionado atrás.

Fim do interlúdio. Volto à narrativa corrida.

= PARTE IV =

Minha ousadia em 1966 quase me custou o fim temporário, se não de minha liberdade, pelo menos de meus estudos. O ano de 1966 me parecia, na época, ser o auge da ditadura militar brasileira e do autoritarismo eclesiástico e retrocesso teológico da Igreja Presbiteriana do Brasil, mas eu estava, naturalmente, e duplamente, errado: tanto no país quanto na igreja a situação se tornou ainda muito pior antes do final da década, mas nesse momento eu já estava fora, tanto da igreja, como do país.

Depois de ter sido expulso do Seminário Presbiteriano de Campinas fui acolhido pela Faculdade de Teologia da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (Evangelische Kirche Lutherischen Bekenntnisses in Brasilien), em São Leopoldo, RS, como já mencionei na Parte II. Lá, em 1967, eu completei quatro anos de estudos pós-secundários (embora não tenha concluído o curso teológico). Em São Leopoldo, Rudolf Bultmann (que era Luterano) era bem aceito. O tempo que passei lá ajudou bastante no desenvolvimento do meu domínio da língua alemã (que eu estudava desde o primeiro ano no Seminário de Campinas), porque todas as aulas eram ainda em alemão, naquela época.

O ambiente intelectual fornecido pela Faculdade de Teologia Luterana era bastante estimulador. A despeito disso, ou, mais provavelmente, por causa disso, meus laços pessoais com a igreja começaram a enfraquecer bastante, mais ou menos durante o período em que eu estive em São Leopoldo. Meu interesse pela religião como fenômeno sócio-cultural e pela teologia como disciplina intelectual continuam, entretanto, até hoje. (Nisso eu, em certo sentido e até certo ponto, modestamente espelhei o que se passou com David Hume, sobre quem eventualmente vim a escrever minha tese de doutoramento: ele deixou a igreja (também Presbiteriana, na Escócia) sem traumas, tanto por razões eclesiásticas como teológicas, depois de uma série de perseguições, mas sempre manteve um interesse pela religião como fenômeno sócio-cultural e pela teologia como disciplina intelectual).

Apesar dos meus laços com a igreja haverem enfraquecido, enquanto em São Leopoldo tive a sorte de receber uma bolsa completa, de três anos, para fazer o Mestrado em Teologia no Pittsburgh Theological Seminary (PTS), de Pittsburgh, PA, EUA. Para poder usufruir a bolsa solicitei uma bolsa de viagem ao National Council of the Churches of Christ in the United States (NCCCUS), e tive a felicidade de vê-la concedida. A bolsa no PTS foi obtida através dos esforços do Prof. Dr. Rev. Gordon Eugene Jackson, então Deão Acadêmico daquela escola, e, durante todo o tempo que lá estive, um querido amigo e uma fonte constante de inspiração. Espero que ainda esteja vivo e bem, pois perdi contato com ele há algum tempo. A bolsa de viagem do NCCCUS foi obtida através dos esforços do Rev. Dr. Aharon Sapsezian, então Secretário Executivo da Associação dos Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE), e outra pessoa que se tornou um outro amigo muito caro (especialmente enquanto vivia em Genebra, Suíça, a terra adotada por João Calvino). O Aharon não só me sugeriu que solicitasse a bolsa ao NCCCUS, mas envidou os maiores esforços para que ela fosse concedida. Expresso publicamente aqui minha gratidão a esses dois grandes amigos. [Tivemos, a Paloma (vide adiante) e eu, o privilégio de participar, em 2011, em São Paulo, da celebração das Bodas de Ouro do Aharon e da Zabel, sua mulher. Foi uma experiência emocionante, que vivemos ao lado do Rubem Alves e da Thaís, sua mulher, também amigos do Aharon e da Zabel — o Rubem há um pouco mais de tempo do que eu. O Aharon e o Rubem, lastimavelmente, morreram pouco tempo depois dessa ocasião — o Aharon em 2012 e o Rubem em 2014. Sinto muita falta deles. O Rubem eu conhecia desde 1964, o Aharon, desde 1967.)

= PARTE V =

Enquanto no PTS, de meados de 1967 até meados de 1970, obtive meu Mestrado em Teologia, na área da História do Pensamento Cristão (conclusão: Maio de 1970). Lá tive o privilégio de estudar com estrelas intelectuais como:

  • Dietrich Ritschl, sobrinho-neto do grande teólogo liberal alemão do século XIX, Albrecht Ritschl, e ele próprio um grande especialista na história do pensamento teológico europeu moderno, que me fez interessado para sempre na história intelectual;
  • Ford Lewis Battles, especialista em pensamento medieval, na Renascença e na Reforma, especialmente em Calvino, sendo o autor da melhor tradução para o Inglês das Institutas da Religião Cristã, que quase me convenceu a tornar-me um historiador medieval;
  • Markus Barth, filho do grande teólogo suíço do século XX, Karl Barth (este já mencionado), cujas aulas eram tão precisas que a gente o tomaria por alemão, e tão claras, que a gente o tomaria por francês;
  • Hans Eberhard von Waldow, que havia ensinado em São Leopoldo antes de ir para Pittsburgh, que, por incrível que pareça, conseguia fazer a História do Antigo Israel parecer viva e interessante;
  • George H. Kehm, professor de teologia sistemática, especialista em Wolfhart Pannenberg, que me fez seu assistente didático e de pesquisa quando entrei no doutorado;
  • e vários outros: Ronald Stone, Walter Wiest, John Gerstner, Robert Paul, John Bald, Douglas Hare.

Minha média durante o mestrado foi suficientemente boa para que eu recebesse sete prêmios e bolsas ao final dos meus três anos no PTS, uma das quais era para cursar o doutorado em área de minha escolha.

Assim, em Setembro de 1970 entrei na University of Pittsburgh (Pitt), também em Pittsburgh, PA, EUA, para começar o meu Ph.D. (e o seminário me permitiu continuar a morar no apartamento em que já vivia e a trabalhar, à noite, em sua magnífica biblioteca). O foco principal de meus estudos foi a História da Filosofia Moderna, especialmente no século XVIII, pois eu estava interessado em epistemologia e Pitt era a melhor universidade americana na área de epistemologia, lógica e filosofia da ciência naquela época. Eu, naturalmente, ainda mantinha (como mantenho até hoje) meu interesse na epistemologia da religião. Esses dois interesses, na epistemologia da ciência e da religião, fizeram-me gravitar para William W. Bartley, III, professor titular do Departamento de Filosofia, cuja obra publicada lidava com esses dois assuntos (em especial, The Retreat to Commitment, publicado originalmente em 1962).

Depois de estudar teologia por algum tempo em Harvard, Bill Bartley foi para a London School of Economics (LSE), em Londres, Inglaterra, para estudar com Karl Raymund Popper. Ele eventualmente se tornou o discípulo amado de Popper. Assim sendo, fui virtualmente constrangido a ler tudo que Popper tinha publicado, e mesmo alguns trabalhos então ainda inéditos (mas aos quais Bill Bartley tinha acesso e dos quais, depois, se tornou o editor, na versão impressa). Depois de um sério desentendimento, Popper e Bartley voltaram a manter relações de amizade e colaboração bastante estreitas, tendo Bill Bartley sido ungido para a invejada tarefa de gerenciar todo o legado intelectual de Popper (e, depois, também de Friedrich von Hayek). À vista disso creio que posso, por direito, considerar-me neto intelectual de Popper — com quem tive o privilégio de trocar algumas cartas em meados da década de 70. A morte prematura de Bill Bartley em 1990 (5 de Fevereiro) roubou-me um mentor e grande amigo e foi motivo de grande tristeza. A morte de Popper em 1994 também foi grandemente sentida – embora não tenha sido prematura (ele nasceu em 1902). (A relação entre Popper e Bartley é bem e corretamente descrita em um artigo interessante de Mariano Artigas “The Ethical Roots of Popper’s Epistemology”).

Sob a orientação firme de Bill Bartley concluí meu doutorado em tempo recorde, em Agosto de 1972, com uma tese de 620 páginas sobre  David Hume. Por mim eu teria continuado polindo o que eu esperava fosse tornar minha obra prima, mas Bill não me deixou, virtualmente me obrigando a entregar a tese na forma em que se encontrava. Foi aprovada sem ressalvas.

Em Pitt também tive o privilégio de estudar com Wilfrid Sellars, que foi o membro sênior de minha Banca de Doutoramento. Na home page dedicada a ele na University of Chicago, Keith Lehrer (filósofo bem conhecido) diz que “Sellars [foi] um dos mais importantes filósofos do século, talvez de todos os séculos”. Ele era também um professor fabuloso. Meu primeiro curso com ele foi um Seminário sobre Metafísica e Epistemologia. Depois fiz seu famoso seminário sobre Kant. Os cursos eram tão bons que eu comecei a frequentar tudo que era curso que ele dava: até mesmo, como ouvinte, alguns cursos introdutórios em nível de graduação (sobre Empirismo Britânico e sobre Filosofia Analítica, por exemplo). A maior parte do que eu sei sobre Filosofia Analítica aprendi com ele. Outros bons professores que tive em Pitt foram Nicholas Rescher (Lógica e Epistemologia), Richard Gale (Metafísica, Filosofia do Tempo, Filosofia Analítica), Kurt Baier (Ética), Joseph Kemp (Empiristas Britânicos), e Marilyn Frye (Kant). Olhando para trás posso ver por que o Departamento de Filosofia de Pitt era considerado o melhor do país naqueles anos.

= PARTE VI =

Depois de receber meu Ph.D. fui contratado para lecionar filosofia, primeiro pela California State University at Hayward (hoje California State University, Eastbay), em Hayward, CA, EUA (1972-1973), e, no ano seguinte, pelo Pomona College, um dos “colleges” do complexo chamado Claremont Colleges, em Claremont, CA, EUA (1973-1974). Felizmente, naquela época as normas do politicamente correto ainda não imperavam no cenário acadêmico americano. (Peter Drucker foi professor, por muitos anos, da Claremont Graduate School, que era a divisão de Pós-Graduação dos Claremont Colleges).

Enquanto trabalhava em Pomona tive uma das experiências intelectuais mais excitantes de minha vida: ler Ayn Rand pela primeira vez. A experiência fez de mim uma pessoa diferente. Sou para sempre grato ao meu colega de Pomona, Charles J. King, que veio a ser presidente do Liberty Fund, por recomendar que eu lesse Atlas Shrugged  (A Revolta de Atlas, ou, em edição anterior, Quem é John Galt?, em português). Desde aquele momento, em 1973, Ayn Rand se tornou minha principal mentora intelectual, ética e política, embora meu relacionamento com ela nunca tenha tido o fervor quase-religioso daqueles para quem Objetivismo, mais do que uma filosofia, é um culto – quando encontrei Ayn Rand eu já tinha tido minha experiência religiosa há muito tempo. Mas Ayn Rand permanece até hoje como a influência mais forte e mais permanente sobre o meu pensamento metafísico, epistemológico, ético, político e até mesmo estético – vale dizer, do meu pensamento filosófico, embora ultimamente tenha sofrido forte influência de Murray Rothbard, Stephen R. Covey e Martin E. P. Seligman.

No todo passei sete anos nos Estados Unidos (Agosto de 1967 a Junho de 1974), sem voltar ao Brasil sequer uma vez. O clima político no Brasil durante esses anos era tão inóspito que eu dificilmente teria me arrependido de ter passado todo esse tempo fora, ainda que esses anos não houvessem sido os mais frutíferos de minha vida, do ponto de vista intelectual.

= PARTE VII =

Em Junho de 1974, com a intermediação de meu primo Anello Sanvido Filho (hoje vivendo em Calgary, Canadá), e uma participação especial do Rubem Alves (que na ocasião trabalhava lá), retornei para o Brasil para lecionar na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em Campinas, SP, onde fiquei, até o fim de 2006, dando aula de Epistemologia, Filosofia Política e Filosofia da Educação (e, de vez em quando, de Tecnologia e Educação).

Por uns tempos, na década de oitenta, envolvi-me com administração universitária e até mesmo com política acadêmica. Fui Diretor da Faculdade de Educação por oito anos (quatro dos quais como Diretor Associado), Presidente da Comissão de Orçamento por dois mandatos, Pró-Reitor para Assuntos Administrativos por dois anos, etc. (Vide meu artigo “Minha Gestão na Direção da Faculdade de Educação da UNICAMP (1980 a 1984)”, publicado em Autobio Space, https://autobiospace.wordpress.com/2015/11/07/minha-gestao-na-direcao-da-faculdade-de-educacao-da-unicamp-1980-a-1984/.

Enquanto na UNICAMP, e quando ocupava o cargo de Diretor da Faculdade de Educação (de 1980 a 1984), fiquei interessado no uso de computadores na educação (mais na aprendizagem do que no ensino, para dizer a verdade). Isto me levou, por volta de 1981, para um caminho intelectual paralelo que, eventualmente, acabou se tornando um grande interesse profissional: o uso das tecnologias de informação e comunicação como ferramenta que expande a capacidade de trabalho intelectual do homem, na educação, na saúde e no mundo dos negócios, e como constituidoras de novos ambientes de aprendizagem, trabalho e lazer. Criei, na UNICAMP, in 1983, o Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED), que dirigi até Abril de 1986. Ele existe até hoje. Fez 36 anos neste ano de 2019.

= PARTE VIII =

De Abril de 1986 até o Abril de 1990 fui emprestado, pela UNICAMP, ao Governo do Estado de São Paulo. De Abril 1986 até Março de 1987, fui Diretor do Centro de Informações Educacionais (CIE) da Secretaria de Estado da Educação. De Março de 1987 até o fim de 1988 fui Diretor do Centro de Informações de Saúde (CIS) da Secretaria de Estado da Saúde. Nessa posição travei contato com as pessoas que ocupavam posição equivalente na World Health Organization (WHO), de Genebra, Suíça, e na PanAmerican Health Organization (PAHO), de Washington, DC, EUA, às quais prestei consultoria em várias ocasiões desde 1988. Durante o ano de 1989 fui Diretor de Publicações da Secretaria de Estado da Saúde. De 1987 a 1989 fui também membro do Conselho Estadual de Informática (CONEI) do Estado de São Paulo.

= PARTE IX =

No início de 1990 retornei à UNICAMP. Em 1992, através de autorização especial da Reitoria, fiz parte do seleto grupo (liderado pelo Prof. Dr. Maurício Prates de Campos Filho, infelizmente, já falecido) que ajudou a criar o Curso de Pós-Graduação Profissional (Mestrado) em Gerenciamento de Sistemas de Informação na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP), também em Campinas, SP. Depois de estar o programa em pleno funcionamento, com várias dissertações defendidas, e tendo se esgotado o período para o qual minha colaboração havia sido autorizada, voltei para a UNICAMP, em tempo integral, em 1997.

No final da década de 1990 e início da primeira década de 2000 prestei consultoria ao Instituto Adventista São Paulo (IASP), de Hortolândia, que era o nome então dado ao Colégio Adventista de Hortolândia, instituição que, em regime de internato-externato, ministrava a Educação Básica (algo que continua a fazer), para que a instituição pudesse vir a implantar cursos superiores, que lhe permitissem integrar-se, como de fato veio a acontecer, ao Centro Universitário Adventista de São Paulo (UNASP), que então estava em formação, e que agora está plenamente em funcionamento, com campi também em São Paulo (vários locais) e Engenheiro Coelho. O convite foi feito pelo Pastor Éder Leal, então responsável pela área acadêmica da escola, e pelo Pastor Irineu Rosales, diretor da instituição. Revi, encaminhei e acompanhei a criação do Curso de Pedagogia na instituição, que começou a funcionar em 1999, sendo o primeiro Curso Superior a funcionar ali (Vide: https://www.unasp.br/noticias/semana-ira-celebrar-contribuicoes-da-educacao-adventista-no-brasil/). Até hoje tenho muitas amizades queridas que foram feitas e nutridas naquela experiência. Fui convidado a participar de vários eventos marcantes relativos a esse curso, como a formatura de sua primeira turma, o aniversário de dez anos e o aniversário de quinze anos do curso. Este ano o curso comemorou vinte anos! O UNASP teve nota máxima do MEC no ano passado. (Vide https://www.unasp.br/cincoestrelas/).

= PARTE X =

No início da década de 80 tornei-me consultor da empresa People Computação, em Campinas, SP, uma escola de informática. De 1990 até 1994 aquela companhia licenciou várias franquias. No final de 1994, foi criada uma nova empresa, People Brasil Informática, que passou, mediante contrato, a franquiar a marca, a gerenciar a rede de franquias, e a dar suporte técnico e operacional a ela. Eu tornei-me sócio, e, eventualmente, único proprietário dessa companhia. Em Março de 1998 as duas companhias terminaram seu relacionamento e as franquias voltaram à companhia original. Posteriormente a rede foi comprada pela Wizard, de meu amigo Carlos Wizard Martins, que, depois de um tempo, vendeu sua enorme rede de franquias de cursos de Inglês e de Informática para a americana Pearson’s.

Antes disso criei, em Junho de 1997, a empresa PBR Informática, empresa que usa o nome fantasia Mindware (em regra acompanhado de outros substantivos, conforme o caso: Mindware Tecnologia, Mindware Edutec.Net, Mindware Editora, Mindware Consultoria, e, ultimamente, simplesmente Mindware Education), especializada em instrumentos e ferramentas (ware) usadas pela mente (mind).

Essa empresa, com foco em tecnologia educacional, desenvolveu, durante alguns anos, materiais instrucionais e de auto aprendizado na área de informática para escolas e outras instituições envolvidas no treinamento em informática e no uso de ferramentas de informática na educação. Ela, até hoje, presta assessoria a escolas e consultoria a empresas, organizações não-governamentais e órgãos de governo nas áreas em que a tecnologia interfaceia com a educação e o treinamento e em que a gestão de processos de mudança e inovação é importante.

Em 1998 comecei a me tornar parceiro da área da Educação da Microsoft Brasil, parceria essa que se estreitou através dos anos. A partir de 2003 me tornei, por indicação da subsidiária brasileira, membro do Comitê Assessor Internacional do Programa “Partners in Learning” da Corp — isto é, na matriz da Microsoft, em Redmond, WA, EUA, função que exerci até 2013. Em 2003 também me tornei Coordenador do Comitê Assessor do Programa aqui no Brasil, função que exerci enquanto durou o Comitê, que aqui no Brasil era chamado de Fórum de Líderes Educacionais. “Partners in Learning” veio a ser chamado “Parceiros na Aprendizagem” aqui no Brasil. A parceria com a Microsoft Brasil, que também durou até 2013, embora a natureza do serviço que prestava tenha se alterado. Essas parcerias com a Microsoft foram fonte de enorme aprendizado, de múltiplos contatos extremamente interessantes, de um sem número de viagens internacionais, e de grande satisfação profissional e pessoal. Através dela, por exemplo, fui a Taiwan, todos os anos, entre 2004 e 2008, para atuar como Keynote Speaker do Education and Technology Forum, tendo ido mais de uma vez em alguns anos. Fiz grandes amigos dentro da Microsoft, dentre os quais destaco Márcia Teixeira, Adriana Pettengill, Greg Butler (infelizmente, prematuramente falecido), Vincent Quah, Emílio Munaro. Tive o privilégio de conhecer ali a minha amiga Ana Teresa Ralston.

Em 1999 comecei, por indicação da Microsoft, a prestar consultoria ao Programa “Sua Escola a 2000 por Hora”, do Instituto Ayrton Senna (IAS), programa esse então totalmente financiado pela Microsoft. Meu trabalho se concentrou, por um bom tempo, nesse programa, depois rebatizado de “Escola Conectada”. Depois me envolvi também no Programa “Comunidade Conectada”, voltado para parceria com TeleCentros. Eventualmente fui solicitado, em 2002, a elaborar um projeto de Cátedra UNESCO em Educação e Desenvolvimento Humano dentro do Instituto, e desse projeto resultou a Cátedra UNESCO de Educação e Desenvolvimento Humano no Instituto Ayrton Senna, que coordenei, desde sua sua implantação, em 2003. Coordenei a Cátedra desde a aprovação até minha saída do Instituto, em Dezembro de 2006. Em 2011 voltei a trabalhar com o IAS e em 2012 reassumi a Coordenação da Cátedra UNESCO. Trabalhar com essa nobre instituição sempre foi uma fonte de enorme prazer e constante aprendizado. Fiz grandes amigos ali dentro. A mais chegada foi Adriana Martinelli Carvalho, que coordenava a área de Educação e Tecnologia. Kátia Ramos e Simone Menella também são grandes amigas. Viviane Senna é, naturalmente, uma fonte constante de inspiração.

= PARTE XI =

No final de 2006 me aposentei da UNICAMP, cessei minha consultoria ao Instituto Ayrton Senna e assumi, a partir de Janeiro de 2007, o cargo de Secretário Adjunto de Ensino Superior do Estado de São Paulo, a convite do Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti (hoje falecido), que havia sido meu colega na UNICAMP desde 1974, que era na ocasião Deputado Federal, e que acabava de ser escolhido pelo então Governador José Serra para ser o Secretário. A passagem por essa secretaria, criada no governo Serra, foi curta, para mim e para o Prof. Pinotti. Não ficamos ali mais de um semestre. Por incompatibilidades políticas (ele era dos Democratas), saímos.

Ao sair do governo assumi, a convite do empresário Ricardo Semler, a Presidência do Instituto Lumiar, em São Paulo. O Instituto Lumiar é responsável pelas Escolas Lumiar. Fiquei nessa posição por dois anos. Vide o resultado do trabalho realizado em meus blogs Escola Lumiar e Lumiar Space, em https://escolalumiar.wordpress.com/ e https://lumiar.space/, com a inestimável colaboração de Paloma Epprecht e Machado.

= PARTE XII =

Por falar na Paloma, entro na esfera mais familiar da minha vida. Vivi com ela, em união estável, desde 6 de Setembro de 2008. Moramos, de início, em São Paulo (primeiro na Chácara Klabin, depois no Morumbi). Em Dezembro de 2015 nos mudamos para Salto, SP, onde temos um sítio, em virtude de a Paloma começar a trabalhar em Capivari, SP, quase do lado do sítio. (Vide adiante). Em 15 de Maio de 2012 nossa união estável foi convertida em casamento “no papel”, e, portanto, desde então somos legal e oficialmente casados. Ambos mudamos nosso nome nesse processo. Ela para Paloma Epprecht e Machado de Campos Chaves e eu para Eduardo Oscar Epprecht e Machado de Campos Chaves. Os nomes ficaram meio longos demais, mas queríamos incorporar aos nossos nomes os sobrenomes do outro. Em 3 de Julho de 2012 casamo-nos na igreja (a Catedral Evangélica de São Paulo, de que somos membros).

A Paloma, além de mulher, é parceira no trabalho, pois atuamos, profissionalmente, exatamente na mesma área. Foi assim que nos conhecemos, em 2004, no Congresso TecEduc@tion. Trabalhamos juntos em projetos da Microsoft (Parceiros na Aprendizagem, Aprender em Parceria), em 2005 e 2006. Em 2007, quando assumi a Presidência do Instituto Lumiar, convidei-a a vir trabalhar como Coordenadora Pedagógica do Instituto — convite que ela pode aceitar apenas a partir de Janeiro de 2008, posto que trabalhava na Secretaria da Educação do Município de São Bernardo do Campo. Ficamos no Instituto Lumiar até quase o final do primeiro semestre de 2009 e fizemos um trabalho que reputo extremamente importante. Boa parte dele está transcrito nos sites mencionados atrás. Depois disso a Paloma, como eu, passou a atuar como Consultora Independente no mercado, na área de Educação (currículo, metodologia, avaliação) e Tecnologia. Já prestou serviços de consultoria nessa área para a Microsoft, o Instituto Crescer para a Cidadania, o Instituto Paramitas, a Fundação Bradesco, o CENPEC (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), o Programa Um Computador por Aluno (UCA), junto à Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP), etc. Trabalhou no Colégio Visconde de Porto Seguro, Unidade I (Morumbi), na área de Tecnologia e Educação, de 2011 a 2015. A partir de Dezembro de 2015 começou a trabalhar no Instituto Federal de São Paulo (IFSP), Campus de Capivari, atuando na área das Disciplinas Pedagógicas da Licenciatura.

A Paloma concluiu seu Mestrado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), na área de Currículo, no ano de 2012 (Agosto), tendo tido o privilégio de ser orientanda do Prof. Dr. Fernando José de Almeida. Agora (desde 2017) cursa o Doutorado na Universidade de São Paulo (USP), na Faculdade de Educação, tendo o privilégio de ser orientanda do Prof. Dr. Ulisses Ferreira de Araújo. Deve defender sua tese em meados de 2021.

A Paloma tem duas filhas jovens lindas, a Bianca (nascida em 1996) e a Priscilla (nascida em 1998). A Bianca já concluiu seu curso superior em Gestão Ambiental na FMU, em São Paulo, onde agora reside, e a Priscilla terminou no primeiro semestre deste ano o curso de Biomedicina na UNESP de Botucatu, onde também residiu até então. Desde agosto deste ano vem fazendo estágio no Instituto Butantã.

Não gosto muito do termo “enteado/a”, porque considero como filhos aqueles a quem ajudo a criar. Mas, para evitar confusão, vou usar o termo aqui. A Bianca e a Priscilla são, portanto, minhas filhas/enteadas mais novas.

Filhos meus, mesmo, tenho duas mulheres, de dois casamentos anteriores: Andrea (nascida em 1973), de meu primeiro casamento (ainda lá nos Estados Unidos, em 1967), e Patricia (nascida em 1975), de meu segundo (que aconteceu pouco tempo depois de eu retornar dos Estados Unidos, em 1974).

De meu segundo casamento tenho, também, dois filhos/enteados: Tatiana (nascida em 1969) e Rodrigo (nascido em 1971). Participei ativamemente da vida deles desde Outubro de 1974, desde quando ainda eram pequeninos (o Rodrigo tinha 3 e a Tatiana 5 anos, quando vieram morar comigo) e por 34 anos. Hoje, em virtude de meu divórcio da mãe deles, estamos, lamentavelmente, distanciados – situação que, espero, não dure para sempre.

Netos já tive sete (mas um deles, Guilherme, infelizmente, morreu uma semana depois de nascer: teria feito dezesseis anos no dia 9 de Setembro deste ano — 2019). Certamente conto como netos também os filhos dos filhos/enteados. São esses os seus nomes e seus anos de nascimento Gabriel (1999), Olívia (2002), Guilherme (2003), Gabriela (2004), Marcelo (2005), Madeline (2005) e Felipe (2006). Gabriel é filho da Tatiana, Olivia e Madeline, da Andrea, Guilherme e Marcelo, da Patrícia, e Gabriela e Felipe, do Rodrigo. (Mais informação sobre netos, a seguir).

A Andrea, nascida em 1973, se formou em Marketing Internacional em Grove City College, em Grove City, PA, EUA. Foi, por algum tempo, Consultora Financeira dos produtos financeiros do American Express na região de Warren, OH, EUA. Hoje possui uma Imobiliária e trabalha com venda, aluguel e administração de imóveis. Casou-se com Richard Jeffry Mathews, gerente de vendas e marketing, em 1998, mas se divorciou em 2015. Casou-se pela segunda vez, agora com John Wolford, em 6 de Outubro de 2018. O John trouxe para a família um casal de filhos: Kent, de 18 anos (em 2019), e Sidney, de 17 (em 2019), que eu, naturalmente, acrescento como meus netos. A Andrea e o John vivem em Cortland, OH, EUA, com os filhos. Kent começou o college neste ano de 2019. Ele é quarterback do time de futebol americano da instituição. A Sidney começa a universidade em 2020 com bolsa da Força Aérea Americana, na qual ingressou.

A Patrícia, nascida em 1975, formou-se (em 1999) em Odontologia na Universidade São Francisco (USF), em Bragança Paulista, SP, e é, hoje, Especialista na Área de Periodontia. Exerce a odontologia em Valinhos. Começou a fazer o Mestrado na Faculdade de Medicina da UNICAMP, na área de moléstias sexualmente transmissíveis, mas interrompeu o curso. Casou-se com Rubens Frota de Moraes Salles, também dentista, em 2003, mas se divorciou. Ela mora em Campinas, SP, com o Marcelinho. Tem um relacionamento estável com Rodrigo Mattos, embora cada um continue a viver em sua casa. Esse relacionamento estável me trouxe mais três netos: Pedro e as gêmeas Luiza e Laura.

O Rodrigo, meu enteado, nascido em 1971, é engenheiro de computação pela UNICAMP (formado na primeira turma, a de 1990). Trabalha como contratado PJ de uma empresa da área de sistemas em São Paulo e Campinas. Em 2 de Setembro de 2000, casou-se com Adriana Tavares, fisioterapeuta formada (em 1999) pela  Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), Piracicaba, SP. Eles moram em Campinas, SP, num sítio, com a Gabriela e o Felipe, que também considero meus netos, apesar do afastamento.

A Tatiana, minha enteada, nascida em 1969, é engenheira civil, formada pela PUCCAMP, mas trabalha, hoje, como funcionária pública no judiciário paulista, em Campinas. Ela se casou, em 1 de Fevereiro de 1997, com Alexandre Montgomery Wild, promotor público, formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em São Paulo, SP. Eles também moram em Campinas, com o Gabriel, que foi, e continua sendo, no meu coração, o meu primeiro neto, nascido que foi em 1999. Fez 20 anos este ano.

Meus netos são, por enquanto, todos estudantes. Onze, numa contagem inclusiva, mais ou menos pela ordem: Gabriel Wild, Kent Wolford, Olivia Mathews, Sidney Wolford, Marcelo de Moraes Salles, Madeline Mathews, Pedro Mattos, Gabriela Romero, Felipe Romero, Luiza Mattos e Laura Mattos.

Meus pais são falecidos: meu pai, o Rev. Oscar Chaves, em 5 de Março de 1991, minha mãe, Edith de Campos Chaves, em 11 de Junho de 2008. Tenho um irmão e duas irmãs: o Flávio (nascido em 1946), a Priscila (nascida em 1957) e a Eliane, a caçula (nascida em 1959). O Flávio é casado com a Inês e tem dois filhos: Flávio Júnior (Flavinho) e César. Eles moram em Santo André, SP. O Flávio Júnior é casado com a Aninha, mora em São José do Rio Preto, SP, e estão esperando sua primeira filha (Laura) para este mês de Julho de 2019. O César é casado com a Juliana e eles têm dois filhos, chamados (também) Gabriel e Lucas. O Flávio e da Inês terão três netos, portanto, a partir deste mês de Julho de 2019. O César e a Juliana moram, com os filhos, em Seattle, WA, USA, onde ele trabalha na Amazon e ela dirige uma escolinha maternal. A Eliane é casada com o João e eles também têm dois filhos: Vítor e Diogo. Os quatro moram em Santo André. Minha irmã Priscila é solteira e também mora em Santo André.

O pai da Paloma, José de Oliveira Machado Neto. e a mãe, Ana Maria Epprecht Machado, ela lamentavelmente falecida em Outubro deste ano, moraram, parte do tempo em Ubatuba, SP, e parte do tempo em Guarulhos, SP. Conheci o pai da Paloma no final da década de 50, início da década de 60, na Igreja Presbiteriana do Parque das Nações, em Santo André, que ele frequentava e da qual meu pai era pastor. Essa é uma das coincidências de nossa vida. (Outras duas: dois tios dela eram amigos meus de adolescência e juventude, na mesma igreja que o pai dela frequentava – e foi meu pai que fez o casamento deles, muito tempo atrás).

A Paloma tem dois irmãos: a Ana Patrícia, mais velha do que ela, e o Rafael, mais novo do que ela. A Ana Patrícia mora em Guarulhos, é casada com o Fábio, e tem três filhos: Aline, Éverton e Júlia. A Aline já é casada (com o Alexandre, apelidado carinhosamente de Japa), e eles têm um encanto de filhinha, a Milena (a japinha mais linda que eu conheço) e mais um menino, o Matheus, nascido em 2018. O Rafael é casado com a Carolina (Carol) e mora em São Paulo, e eles em 2017 tiveram um menino, chamado Samuel, no ano seguinte, outro, chamado Levi.

= PARTE XIII =

Pela intermediação da Paloma restabeleci meus laços com a igreja e a religião. Frequentamos, desde que estamos juntos, e dela somos membros, desde 2010, a Catedral Evangélica de São Paulo (também conhecida como Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo), na Rua Nestor Pestana, no Centro. Facilita muito esse processo o fato de ter frequentado essa igreja no passado, ter ali vários amigos, em especial o Rev. Elizeu Rodrigues Cremm e sua mulher, Marli, que foram meus colegas no Instituto JMC nos idos de 1961-1963). Daqui um ano e pouco fará 60 anos que nos conhecemos e somos amigos. No início deste ano (2019), em Fevereiro, fez 58 anos que o Elizeu, a Marli e eu nos conhecemos e ficamos amigos. Apesar do longo interlúdio fora da igreja, sinto-me totalmente em casa na Catedral — até porque ela mantém um hinário que contém todos os meus hinos mais queridos (que minha amiga, também do JMC, a Maestrina Dorothéa Machado Kerr, filha de meu ex-professor, Rev. Joaquim Machado, gravou com o Coral Evangélico de São Paulo, em inúmeros CDs).

Continuo a ter muitas dúvidas em teologia e para a maioria das questões da religião não encontrei respostas convincentes ou totalmente convincentes. Mas voltei a achar as questões fascinantes, como um dia as achei. Foi por isso que voltei a dar atenção ao estudo da Teologia. Os problemas com a instituição eclesiástica acabaram por me levar a afastar essas questões de meu foco de interesse por muito tempo. Felizmente, estou, aos poucos, com o apoio e o incentivo da Paloma, fazendo as pazes com o meu passado. (O fato de meu sobriho Vitor, sobrinho de minha irmã Eliane, haver decidido se tornar teólogo também me motivou. Ele tem Mestrado e Doutorado em Ciências da Religião no Programa de Pós-Graduação da Universidade Metodista de São Paulo. Foi contratado há dois anos para ser Professor do Programa. Antes de sua contratação, estudou na Sorbonne, em Paris, por um ano. Tenho enorme orgulho dele.)

= PARTE XIV =

Como já mencionado atrás, por incrível que pareça, fui convidado em 2014 a dar aulas de História da Igreja e História do Pensamento Cristão na Faculdade de Teologia São Paulo (FATIPI) da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (IPIB), mantida pela Fundação Eduardo Carlos Pereira. Fiquei lá até 2017, tendo me desligado em Junho, em virtude de nossa mudança para Salto.

= PARTE XV =

Informações sobre minhas publicações, sobre meus projetos profissionais, sobre os cursos que costumava ministrar, sobre meus interesses pessoais, bem como sobre como me contatar, podem ser encontradas em diferentes locais do meu site https://chaves.space, que é o meu Portal, e em meus Perfis (Timelines), dos quais há três, e Página (Page) no Facebook, em, respectivamente:

Além do meu Portal, mantenho vários blogs, que me são muito importantes. Já mencionei dois deles: há pelo menos mais trinta. O acesso é pelo meu Portal Chaves Space, que também abriga este blog.

Detalhes sobre a vida da gente normalmente só interessam a gente mesmo. Se, a despeito disso, você chegou até o fim desta longa página, receba meus parabéns pela paciência. Poucos são os que chegam até aqui.

[Redigido originalmente em Salto, em 1995, revisto e ampliado em São Paulo, em 15 de Maio de 2012 (dia do aniversário da Paloma e de nosso casamento civil), em 15 de Novembro de 2017 (dia da Proclamação da República), em 3 de Julho de 2019 (dia do sétimo aniversário do meu casamento com a Paloma na Igreja), e hoje, 16 de Dezembro de 1976].

Eduardo Chaves

Gente Tóxica

Compartilho um post publicado pela minha filha, Andrea Chaves. Infelizmente, está em Inglês. Mas resumo em Português o teor básico do artigo. O resumo inclui alguns acréscimos meus.

Podemos viver em ambientes saudáveis ou em ambientes poluídos. Alguns tipos de poluição são desagradáveis mas não causam, necessariamente, mal à nossa saúde física. Isso acontece com a poluição visual — embora ela possa nos deixar deprimidos, causando mal à nossa saúde mental. Outros ambientes, como os tóxicos, cheios de gases que podem até mesmo encurtar nossa vida, destroem, ainda que gradativamente, nossa saúde física.

O que não se percebe, muitas vezes, é que ambientes humanos podem também ser saudáveis ou tóxicos. Existem pessoas que são tóxicas, que contaminam nosso ambiente humano e nos causam grande mal. Podem fazer com que duvidemos que somos pessoas sadias, podem nos induzir a acreditar que somos incompetentes, ou incapazes, ou imaturos, ou inseguros, quando, de fato, em outros ambientes, mais saudáveis, não somos nada disso.

Quando se trata de um amigo, um relacionamento afetivo, um cônjuge, é sempre possível fugir — deixar o amigo, quebrar o relacionamento afetivo, separar-se do cônjuge. Mas, e quando se trata de um genitor, um irmão, ou mesmo um filho? Somos condicionados a acreditar que a família é sempre uma coisa boa, que nos apoia, que nos ajuda, que nos fortalece emocionalmente. Mas esse nem sempre é o caso. Há situações em que a família, ou, mais frequentemente, um membro específico dela com o qual somos condenados a conviver, pode ser altamente tóxico, causar-nos mal do ponto de vista emocional, da auto-estima, da auto-imagem, da auto-confiança, da segurança que deveríamos ter acerca de nossa própria identidade. Às vezes pode até nos causar mal físico, como no caso de pais que maltratam fisicamente os filhos ou abusam deles sexualmente. Neste caso, a melhor providência é denunciar à Polícia. Mas o que fazer quando o cal causado é psicológico, emocional, sutil, causado por parentes manipulativos (às vezes uma mãe, outras um pai), quando se faz mal sob a pretensão de estar fazendo bem, quando se maltrata fazendo de conta que se está ajudando, educando, contribuindo para a formação da pessoa. Lobos podem aparecer em pele de cordeiros. E isso pode acontecer dentro da família.

Em casos assim, há nove sugestões no artigo abaixo, que partem do pressuposto que pode haver soluções menos drásticas do que um rompimento total. Mas, ao final, ao discutir a décima sugestão, assinala-se que, muitas vezes, soluções contemporizadoras e paliativas não resolvem o problema. Em casos assim, é preciso constatar que o rompimento total é a única solução. Como pode acontecer no casamento, também no relacionamento “vertical” (genitor / prole) pode acontecer que pessoas que amamos, e que, aparentemente, nos amam também, nos causem muito mal. Neste caso, o rompimento é a única solução não paliativa. Afinal de contas, é da nossa vida que se trata. Romper é, em casos assim, uma medida de autoproteção, de proteção à nossa vida e ao que de melhor há nela. E o rompimento, apesar de dolorido, irá trazer um grande sentimento de libertação.

Se algo que escrevi faz sentido para você, leia o artigo inteiro. Se não souber Inglês o suficiente para ler, peça a alguém que saiba que leia para você. Far-lhe-á bem descobrir que seu problema não é único: que há outros que tiveram o mesmo problema — e que aprenderam a soluciona-lo.

É isso. Boa sorte. Tudo de bom. Thanks, Andrea. Love you.

o O o

Ten Things to Remember About Toxic Family Members

By MARC CHERNOFF

Family is supposed to be our safe haven.  Sometimes, however, it’s the place where we find the deepest heartache.

Letting go of (or breaking up with) a toxic friend, boyfriend or girlfriend is one thing, and there’s plenty of advice out there for doing so, but what about letting go of a toxic family member?

Most of us are not in a position to just walk away, nor do we feel that we want to, or that it’s the right thing to do.  So what do we do when a family member is literally spoiling our lives with their toxicity?  How do we deal with our feelings of obligation, confusion, betrayal and heartache?

First and foremost, you must accept the fact that not everyone’s family is healthy or available for them to lean on, to call on, or to go home to.  Not every family tie is built on the premise of mutual respect, love and support.  Sometimes “family” simply means that you share a bloodline.  That’s all.  Some family members build us up and some break us down.

Second, you must understand that a toxic family member may be going through a difficult stage in their lives.  They may be ill, chronically worried, or lacking what they need in terms of love and emotional support.  Such people need to be listened to, supported, and cared for (although whatever the cause of their troubles, you may still need to protect yourself from their toxic behavior at times).

The key thing to keep in mind is that every case of dealing with a toxic family member is a little different, but in any and every case there are some universal principles we need to remember, for our own sake:

o O o

 1. They may not be an inherently bad person, but they’re not the right person to be spending time with every day.

Not all toxic family relationships are agonizing and uncaring on purpose.  Some of them involve people who care about you – people who have good intentions, but are toxic because their needs and way of existing in the world force you to compromise yourself and your happiness. And as hard as it is, we have to distance ourselves enough to give ourselves space to live.  You simply can’t ruin yourself on a daily basis for the sake of someone else.  You have to make your well-being a priority.  Whether that means spending less time with someone, loving a family member from a distance, letting go entirely, or temporarily removing yourself from a situation that feels painful – you have every right to leave and create some healthy space for yourself.

 2. Toxic people often hide cleverly behind passive aggression.

Passive aggressive behavior takes many forms but can generally be described as a non-verbal aggression that manifests in negative behavior.  Instead of openly expressing how they feel, someone makes subtle, annoying gestures directed at you.  Instead of saying what’s actually upsetting them, they find small and petty ways to take jabs at you until you pay attention and get upset.  This is obviously a toxic relationship situation.  It shows this person is set on not communicating openly and clearly with you.  Keep in mind that most sane human beings will feel no reason to be passive-aggressive toward you if they feel safe expressing themselves.  In other words, they won’t feel a need to hide behind passive aggression if they feel like they won’t be judged or criticized for what they are thinking.  So make it clear to your family members that you accept them for who they are, and that they aren’t necessarily responsible or obligated to your ideas and opinions, but that you’d love to have their support.  If they care about you, they will likely give it, or at least compromise in some way.  And if they refuse to, and continue their passive aggression, you may have no choice but to create some of that space discussed in point #1.  (Read Emotional Blackmail.)

3. They will try to bully you into submission if you let them.

We always hear about schoolyard bullies, but the biggest bullies are often toxic family members.  And bullying is never OK.  Period!  There is no freedom on Earth that gives someone the right to assault who you are as a person.  Sadly, some people just won’t be happy until they’ve pushed your ego to the ground and stomped on it.  What you have to do is have the nerve to stand up for yourself.  Don’t give them leeway.  Nobody has the power to make you feel small unless you give them that power.  It takes a great deal of courage to stand up to your enemies, but just as much to stand up to your family and friends.  Sometimes bullying comes from the most unlikely places.  Be cognizant of how the people closest to you treat you, and look out for the subtle jabs they throw.  When necessary, confront them – whatever it takes to give yourself the opportunity to grow into who you really are.

4. Pretending their toxic behavior is OK is NOT OK.

If you’re not careful, toxic family members can use their moody behavior to get preferential treatment, because… well… it just seems easier to quiet them down than to listen to their grouchy rhetoric.  Don’t be fooled.  Short-term ease equals long-term pain for you in a situation like this.  Toxic people don’t change if they are being rewarded for not changing.  Decide this minute not to be influenced by their behavior.  Stop tiptoeing around them or making special pardons for their continued belligerence.  Constant drama and negativity is never worth putting up with.  If someone in your family over the age 21 can’t be a reasonable, reliable, respectful adult on a regular basis, it’s time to speak up and stand your ground.

5. You do not have to neglect yourself just because they do.

Practice self-care every day.  Seriously, if you’re forced to live or work with a toxic person, then make sure you get enough alone time to rest and recuperate.  Having to play the role of a ‘focused, rational adult’ in the face of toxic moodiness can be exhausting, and if you’re not careful, the toxicity can infect you.  Toxic family members can keep you up at night as you constantly question yourself: “Am I doing the right thing?  Am I really so terrible that they despise me so much?  I can’t BELIEVE she did that!  I’m so hurt!!” Thoughts like these can keep you agonizing for weeks, months, or even years.  Sometimes this is the goal of a toxic family member, to drive you mad and make you out to be the crazy one.  Because oftentimes they have no idea why they feel the way they do, and they can’t see beyond their own emotional needs… hence their relentless toxic communication and actions.  And since you can’t control what they do, it’s important to take care of yourself so you can remain centered, feeling healthy and ready to live positively in the face of negativity when you must – mindfulness, meditation, prayer and regular exercise work wonders!

6. If their toxic behavior becomes physical, it’s a legal matter that must be addressed.

If you’ve survived the wrath of a physical abuser in your family, and you tried to reconcile things… If you forgave, and you struggled, and even if the expression of your grief had you succumb to outbursts of toxic anger… If you spent years hanging on to the notions of trust and faith, even after you knew in your heart that those beautiful intangibles, upon which love is built and sustained, would never be returned… And especially, if you stood up as the barrier between an abuser and someone else, and took the brunt of the abuse in their place… You are a HERO!  But now it’s time to be the hero of your future.  Enough is enough!  If someone is physically abusive, they are breaking the law and they need to deal with the consequences of their actions.

7. Although it’s hard, you can’t take their toxic behavior personally.

It’s them, not you.  KNOW this.  Toxic family members will likely try to imply that somehow you’ve done something wrong.  And because the ‘feeling guilty’ button is quite large on many of us, even the implication that we might have done something wrong can hurt our confidence and unsettle our resolve.  Don’t let this happen to you.  Remember, there is a huge amount of freedom that comes to you when you take nothing personally.  Most toxic people behave negatively not just to you, but to everyone they interact with.  Even when the situation seems personal – even if you feel directly insulted – it usually has nothing to do with you.  What they say and do, and the opinions they have, are based entirely on their own self-reflection.  (Angel and I discuss this in more detail in the “Self-Love” and “Relationships” chapters of 1,000 Little Things Happy, Successful People Do Differently.)

8. Hating them for being toxic only brings more toxicity into your life.

As Gandhi once said, “An eye for an eye will only make the whole world blind.”  Regardless of how despicable a family member has acted, never let hate build in your heart.  Fighting hatred with hatred only hurts you more.  When you decide to hate someone you automatically begin digging two graves: one for your enemy and one for yourself.  Hateful grudges are for those who insist that they are owed something.  Forgiveness, on the other hand, is for those who are strong enough and smart enough to move on.  After all, the best revenge is to be unlike the person who hurt you.  The best revenge is living well, in a way that creates peace in your heart.

9. People can change, and some toxic family relationships can be repaired in the long run.

When trust is broken, which happens in nearly every family relationship at some point, it’s essential to understand that it can be repaired, provided both people are willing to do the hard work of self-growth.  In fact, it’s at this time, when it feels like the solid bedrock of your relationship has crumbled into dust, that you’re being given an opportunity to shed the patterns and dynamics with each other that haven’t been serving you.  It’s painful work and a painful time, and the impulse will be walk away, especially if you believe that broken trust cannot be repaired.  But if you understand that trust levels rise and fall over the course of a lifetime you’ll be more likely to find the strength to hang in, hang on, and grow together.  But it does take two.  You can’t do it alone.  (Read Loving What Is.)

10. Sadly, sometimes all you can do is let go for good.

All details aside, this is your life.  You may not be able to control all the things toxic family members do to you, but you can decide not to be reduced by them in the long run.  You can decide not to let their actions and opinions continuously invade your heart and mind.  And above all, you can decide whom to walk beside into tomorrow, and whom to leave behind today.  In a perfect world we would always be able to fix our relationships with toxic family members, but as you know the world isn’t perfect.  Put in the effort and do what you can to keep things intact, but don’t be afraid to let go and do what’s right for YOU when you must.

The floor is yours…

What are your experiences with toxic family members?  What have you done to cope with their toxic behavior?  Please share your thoughts by leaving a comment below.

http://www.marcandangel.com/2015/05/03/10-things-to-remember-about-toxic-family-members/?c=CYTFB

Em Salto, 17 de Abril de 2016.

Conversas Comigo Mesmo

Estou lendo (desde ontem, 22/3/2016) um livro verdadeiramente interessante: A. N. Wilson, God’s Funeral (W W Norton & Co, NY, 1999). O século 19 é o período em que se acredita que, intelectual e culturalmente, Deus foi a óbito (para usar a linguagem dos médicos). Wilson não só lhe faz a autópsia como analisa sua “causa mortis”, emite-lhe o certificado de óbito e lhe descreve o funeral.

Incrível como alguns autores conseguem relatar o que se passou e continua a se passar com você, sem que jamais tenham acesso à sua história de vida.

Ayn Rand fez isso comigo em 1973 – e faz até hoje. Eu a leio e fico com aquela impressão de que ela me conhece extremamente bem, melhor, talvez, do que qualquer outra pessoa, e que ela está colocando, em linguagem cristalinamente clara e precisa,  o que eu penso, o que eu sinto, o que eu desejo, o que eu considero verdadeiro, certo, belo e sublime — só que nunca havia conseguido formular de forma tão clara e precisa.

A. N. Wilson fez isso comigo também ontem (como disse, comecei a ler seu livro ontem). Se não fosse o cansaço (levantei-me às 2h da manhã ontem), teria passado a noite lendo. Sua descrição da crise de consciência de Thomas Hardy e Leslie Stephen (pai de Virginia Wolff), pensadores do século 19, chega a ser comovente: a mim me deixou emocionado, “moved”… Sempre gostei de Stephen, que tem uma belíssima história do pensamento inglês no século 18, em dois volumes, que eu li em 1970-1971, mas nunca li muito de Hardy, além de Jude the Obscure e Tess of the d’Urbervilles (que se tornaram lindos filmes).

Adorei encontrar em Wilson alguém que coloca, com todas as letras, o fato de que a crise do século 19, a teologia liberal, o próprio existencialismo kierkegaardiano, etc., tudo isso tem como antecedente causal a verdadeira bomba filosófica lançada no século 18 por David Hume, meu santo padroeiro, um dos poucos filósofos de quem admiro a obra mas também gosto da pessoa: gostaria de, como Adam Smith, ter convivido pessoalmente com ele. Que privilégio teria sido!

Eu disse isso em minha tese de doutorado em 1972 basicamente o mesmo que Wilson afirma sobre Hume. O título da minha tese é David Hume’s Philosophical Critique of Theology and its Significance for the History of Christian Thought. Eu era bem menos preguiçoso então: a tese tem 615 folhas… 

Wilson também tem uma biografia de C S Lewis, que eu tenho em São Paulo. Vou relê-la, porque também gosto de Lewis.

Como a gente aprende lendo. Sempre defendi a aprendizagem interativa, colaborativa… A leitura não parece ser uma fonte de aprendizagem desse tipo — mas a aparência é enganosa. Combinando insights de Socrates e de Alfred Adler, eu diria que, na melhor pedagogia da pergunta, o livro (o bom livro, desnecessário frisar) desperta questões em nossa mente, nos faz cócegas nos miolos (como diria o Rubem Alves), nos incita a refletir, e, socraticamente, a lhe fazer, ao livro, novas perguntas… Sócrates criticou o livro por não ser interativo e, por conseguinte, não responder às perguntas que lhe fazemos. Mas aí está seu maior mérito, visto de ângulo construtivista. Não respondendo às nossas perguntas o livro nos obriga a procurar respondê-las nós mesmos, nos provoca a nos colocar em diálogo com nós mesmos, a criar conversas em que somos nossos principais interlocutores.

Refletir é isso: é dialogar consigo próprio, questionar e criticar a si mesmo, é tentar (popperianamente) refutar nossas próprias ideias, especialmente as mais caras. . . Conversas comigo mesmo. Sempre pensei em escrever um livro com esse título — embora ele possa parecer “conceited”, “selfish”, “egoistical” (que alguns escrevem “egotistical”), o cúmulo da ensimesmação: com tanta gente pra conversar, pra que querer conversar consigo mesmo? Não é uma questão de ou uma coisa ou outra. As duas são importantes. O problema, na nossa conversa interminável com os amigos no Facebook, é que a gente pode se esquecer de arrumar tempo para uma conversinha a sós com nós mesmos. Ouvir-nos a alma e tentar aquieta-la, alimenta-la. .  .  Os resultado serão sempre positivos, eu garanto.

Em Salto, 23 de Março de 2016.

Os Idos de Março

Hoje é o dia 1o de Março de 2016. Primeiro de Março deve ter sido uma data importante, porque há, em Campinas, uma rua Primeiro de Março (que liga os bairros da Guanabara e da Vila Nova). Talvez em lembrança do fato de que, em 1870, encerrou-se neste dia a Guerra com o Paraguai, ou do fato que, em 1894, neste dia, houve a primeira eleição direta para Presidente da República no Brasil: foi eleito Prudente de Moraes, da republicana Itu, vizinha de Salto, que assumiu o cargo oito meses depois, em 15 de Novembro daquele ano, como o terceiro presidente da República ainda infante.

A Web me diz também que neste dia nasceram Boticelli, Chopin, Glenn Miller e Yitzhak Rabin (um pintor, dois músicos e um militar e político israelense) – e em que morreram Solano Lopez, Rui Barbosa e Anne Frank (um ditador paraguaio, a “Águia de Haia”, e uma judia vítima de Hitler, famosa pelo diário que escreveu) [Acrescentado depois: em 12/1/2017 estive na casa em que ela morou em Amsterdã].

Foi em 15 de Março que Júlio César foi assassinado por Brutus (“Quoque tu, Brute, fili mi!” – Até mesmo tu, Brutus, meu filho!), em 44 AC. A data é usada para celebrar a transição do período da chamada República Romana para o período conhecido como o do Império Romano. Shakespeare, que escreveu uma peça chamada Julius Caesar, recomendou que tivéssemos cuidado com os Idos de Março…

Para nós, próximo dos Idos de Março deste ano, haverá a grande manifestação do dia 13 que procurará mostrar a força do povo que quer ver Dillma e Lulla longe e que quer que o PT-13, com seus muito mais de 40 petralhas, desapareçam da face da Terra. Quem sabe nos Idos de Março deste ano nos vemos livres do Criador e do seu Poste e, imitando Roma, começamos um novo período de nossa história? Quo usque tandem? (Até quando?)

Para mim, pessoalmente, o mês de Março tem vários significados importantes – alguns bons, outros nem tanto…

Quatro anos atrás. em 2012, neste dia, mudamos para o Morumbi, um apartamento que nos tem trazido muita felicidade. Mudamos para que a Paloma e as meninas estivessem perto do Colégio Visconde de Porto Seguro, em que a Paloma trabalhava, desde Agosto de 2011, e as meninas estavam estudando, desde o início do ano letivo de 2012.

Em 2002, no dia primeiro de Março, tive um enfarto agudo do miocárdio. Quase morri. Fiquei na UTI por mais de uma semana, fui abençoado pelo Padre Marcelo, fiz uma angioplastia, coloquei um stent… Faz 14 anos hoje que quase morri – sem ter conhecido o grande amor da minha vida!!!

Saí do hospital no dia 11, dia em que nasceu a primeira filha, Olivia Grace, de minha filha mais velha, Andrea. Minha primeira neta.

Muito antes disso, em Março de 1952 entrei na escola (já com oito anos e meio). Em 1956, entrei no Ginásio, também em Março. Em 1961, entrei no Colegial Clássico, também em Março. Em 1964, entrei no Seminário, no mês de Março, começando a fazer o curso de Teologia.

Dois anos depois, em 1966, 50 anos atrás, também no mês de Março, eu começava a viver uma odisseia que mudou minha vida. Estava em meu terceiro ano no Seminário Presbiteriano de Campinas, e, no início de Março, fui eleito Secretário Executivo do Centro Acadêmico “Oito de Setembro” (CAOS), e, ato contínuo, fui indicado pela Diretoria para ser o Editor e  Redator Chefe de uma publicação do CAOS – a que dei o nome meio provocante de “O CAOS em Revista”.

Naquele Março de 1966 estávamos terminando o segundo ano da Ditadura Militar, com suas cassações de mandato e expurgos, e a Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) se preparava para fazer o seu expurgo interno e dar início à sua ditadura particular, sob a tutela e o cutelo do Rev. Boanerges Ribeiro. Os seminários da Igreja – havia três: o de Campinas, chamado do Sul, o do Recife, chamado do Norte, e o de Vitória, chamado de Centenário, porque criado no ano em que a o presbiterianismo comemorava 100 anos de Brasil (1959) – estavam no topo da lista da pretendida “limpeza” que a igreja planejava fazer em suas hostes.

O primeiro número do meu jornal saiu no dia 18/3/1966 – vai fazer 50 anos daqui a 18 dias e causou um reboliço. Denunciei o conservadorismo teológico e político do corpo docente, o despreparo dos professores (com uma ou outra exceção) para ocupar a posição que ocupavam naquela hora importante,  e adverti para o golpe que se preparava dentro da Igreja. Chamei o seminário (que tinha pretensões de ser uma “Faculdade de Teologia”) de “Instituto Bíblico” – expressão que, no seio das igrejas presbiterianas e, talvez, protestantes, designa instituições escolares geralmente de baixo nível acadêmico e intelectual, que se limitam a ensinar a Bíblia aos seus alunos, passando ao largo das questões que a chamada “Crítica Bíblica” (textual, literária e histórica) tem levantado nos últimos 250 anos.

Em uma reunião apressada, solicitada por dois professores, o Rev. Waldyr Carvalho Luz e o Rev. Américo Justiniano Ribeiro, a Congregação do Seminário, presidida pelo Reitor, uma das exceções a que fiz menção, o Rev. Júlio de Andrade Ferreira, decidiu que o jornal deveria ser confiscado e determinou ao Reitor que entrasse em contato com o CAOS para que lhe fossem entregues os números ainda não distribuídos do jornal. O Rev. Júlio veio direto ao meu quarto – ele era amigo de meus pais e eu sempre me orgulhei do fato de ele, inúmeras vezes, ter me honrado com inequívocos gestos de amizade e bem-querer – desculpou-se por ter de fazer o que estava fazendo, por determinação da Congregação, e me pediu que lhe entregasse os números ainda em estoque – perto de cem. Já havíamos distribuído o jornal por todo o corpo discente. Guardei comigo cerca de dez números, “para a história”, como imaginei, certamente exagerando a importância do nosso ato de rebeldia.

Nem o Reitor nem a Congregação se lembraram de proibir que o jornal tivesse sequência – e, por isso, imediatamente comecei a trabalhar no número seguinte, que foi publicado em 18/4/66, denunciando a “violência simbólica” perpetrada contra os estudantes, contra seu Centro Acadêmico, e contra mim, em particular – e mais uma vez advertindo os leitores da direção inevitável em que caminhava a Igreja Presbiteriana do Brasil. No meu Editorial fiz referência a John Stuart Mill, resumindo um trecho memorável de seu fantástico livro On Liberty (Da Liberdade). Eis dois parágrafos do que disse então:

“É conscientes desta verdade que levantamos a nossa voz em protesto contra a estreiteza de mente de alguns dentro da IPB para os quais até opinião é delito, para os quais a livre expressão do pensamento é causa suficiente para expurgo! Como é mais fácil lutar para manter as liberdades que já temos do que lutar para reconquistar as liberdades perdidas, “O CAOS em Revista” se dispõe, em suas páginas, a dar livre expressão ao pensamento dos alunos. O número presente é exemplo disto. Não podemos permitir que nos tolham a liberdade de termos os nossos próprios pensamentos e o livre direito de expressá-los. É esta a base da democracia. É esta a base do regime presbiteriano. Em sua obra On Liberty (…) John Stuart Mill faz notar, com toda razão, que silenciar a expressão de uma opinião é roubar a raça humana, tanto a geração presente como a posterior, sendo ainda mais prejudicados os que discordam do que os que mantêm a opinião, pois, se a opinião é correta, aqueles que dela discordam estão perdendo a oportunidade de trocar o erro pela verdade, e, se é errada, os dela discordantes perdem o grande benefício de adquirir uma percepção mais clara e mais viva da verdade, proveniente de sua colisão com o erro. Se as idéias que temos expresso e, esperarmos, continuaremos a expressar através deste jornal não são verdadeiras e são perniciosas, não vingarão, pois a melhor maneira de destruir uma idéia falsa é expô-la! Quem tiver com a verdade não precisa temer idéias, por mais estapafúrdias que sejam, pois terão com que refutá-las, através de um franco diálogo. Aqueles que se creem portadores de ideias verdadeiras, se querem mantê-las, devem torná-las continuamente relevantes, e não impedir que novas ideias apareçam e sejam disseminadas.

Aquilo que tem sido considerado como delito, isto é, a apresentação de ideias que não se harmonizam inteiramente com os padrões oficiais, o delito de opinião, é um crime que devemos praticar diariamente, sob quaisquer riscos. Se deixarmos de ser ‘criminosos’ neste campo, estaremos roubando as gerações passadas que lutaram, até o sangue, para obter as liberdades de que somos herdeiros, a geração presente que estará tendo sua voz sufocada e reprimida, e a geração futura que sentirá que uma geração deixou de realizar o seu papel na história!”

Eu tinha 22 anos quando escrevi isso. Hoje tenho 72. Faz 50 anos.

Poderia ter sido muito pior, e acabou sendo, dentro de alguns meses, mas ali, perto dos idos de Março de 1966, ficou barato para nós.

Em termos, pelo menos. Meu pai, amigo de todos os reverendos mencionados até agora, e meu “tutor eclesiástico” (cada aluno tinha um), foi informado do que eu havia feito e imediatamente se locomoveu de Santo André, onde era pastor da Igreja Presbiteriana de Santo André, para Campinas. Assustei-me quando o vi. Estava assistindo uma aula de Alemão no Instituto Goethe, sucursal de Campinas, no centro da cidade. Meu primeiro pensamento ao vê-lo parado na porta, foi de que minha mãe houvesse morrido e ele estivesse ali para levar-me para o velório. Não era isso. Ele veio me dizer que, ao ouvir o que eu havia feito e ler o que eu havia escrito, ele preferia que eu tivesse nascido morto. Ficou cerca de dois anos sem conversar comigo.

Publiquei mais dois números de “O CAOS em Revista”, em Maio e Junho. Em Julho o Rev. Boanerges Ribeiro foi eleito presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, nomeou uma “Comissão de Seminários” que era comandada por um seu amigo, Coronel do Exército (e presbítero da IPB), Cel. Renato Guimarães, que escolheu visitar o Seminário de Campinas em primeiro lugar. Fomos intimados para entrevistas (depoimentos). Cerca de ¾ do corpo discente se recusou a comparecer. Não mandou nem uma cartinha, feito o Lulla. Fomos expulsos – ficamos impedidos de nos rematricular no segundo semestre de 1966.

Ainda há muita coisa a contar sobre o ano de 1966 da Igreja Presbiteriana do Brasil, em geral, e do Seminário Presbiteriano de Campinas, em particular. O historiador oficial da Igreja, que poderia, 50 anos depois, dizer o que sabe, porque já descobriu. Mas mesmo tanto tempo depois, ele certamente não quer correr a chance de perder os cargos de Historiador Oficial da igreja, de responsável pelos Museus e pelos Arquivos da igreja… Em seus livros e artigos ele diz o que pode, sem ferir suscetibilidades ainda vivas, e passa por cima do que não pode.

Vou escrever aqui neste blog autobiográfico alguns artigos. Tinha planos de escrever uma sequência ao livro Inquisição sem Fogueiras, do Rev. João Dias de Araújo – este, gente do bem. Mas não tive tempo, dadas as minhas outras prioridades. Quando você tem 72 anos, o tempo passa a ficar cada vez mais curto, antes de acabar de vez.

Vários artigos já publicados neste blog tocam no assunto, em especial o que tem o título de “ ‘O CAOS em Revista’: Editoriais e Artigos de 18/3/1966 a 18/8/1966 (alguns censurados) ” que pode ser encontrado em:

https://autobiospace.wordpress.com/2015/11/07/o-caos-em-revista-editoriais-e-artigos-de-1831966-a-1881966-alguns-censurados/

Salto, em 1o de Março de 2016, editado em Ubatuba, 1o de Março de 2017

Crise de Identidade?

Eu só nasci Eduardo Oscar.

Logo virei Oscarzinho. Num relato que meu pai escreveu dos meus dois primeiros anos de vida, começando no dia seguinte ao do meu nascimento, eu já sou Oscarzinho.

Quando entrei na escola (Grupo, Ginásio), em 1952, passei a ser Eduardo.

Quando estive no JMC (Clássico), a partir de 1961, passei a ser Oscar, apelido Juca (por causa do Chaves, naturalmente, mas Juca era o apelido de meu avo materno, José de Campos).

No Seminário, a partir de 1964, eu era Oscar Chaves — virei meu pai, que também estudou la.

Quando minha irmã mais velha nasceu, em 1967, ela passou a me chamar de Oi, porque era isso que eu lhe dizia quando a via — e hoje minha família inteira ainda me chama de Oi.

Nos Estudos Unidos era eu era inicialmente Ed, depois virei Dr. Chaves ou Prof. Chaves (geralmente pronunciado Chavêz ou Tcheivis). O Seminário onde eu estudei lá (fazendo o Mestrado) me chama até hoje de algo que eu nunca fui, Rev. Chaves.

Na UNICAMP fui Eduardo, Chaves, Prof. Eduardo, Prof. Chaves. Algumas de minhas aluninhas de Pedagogia, que não tinham nenhum respeito pelos meus cabelos branqueantes, me chamavam simplesmente de Du.

Quanto meu neto Gabriel nasceu (1999), porque ele tinha dois outros avôs, era preciso sempre dizer vô fulano. Eu virei o vô Dudu.

Depois que passei a viver com a Paloma, virei Edu. Às vezes, quando ela quer ser enérgica, me chama de Edward — algo que ninguém mais jamais me chamou.

Depois que nos casamos no papel, meu nome virou Eduardo Oscar Epprecht e Machado de Campos Chaves. O atendente do INSS em Salto, um velho ranzinza, quando disse a ele que eu havia mudado de nome porque havia adotado os sobrenomes de minha mulher quando do casamento, olhou para mim como se estivesse olhando para um doido varrido… “Por que fazer isso a essas alturas?”, perguntou. Respondi apenas que a lei o facultava. Ele disse: “Tudo bem, mas…” — e houve por bem calar-se. Percebeu que eu estava perto de perder a esportiva…

Só fui o que sou, Eduardo Oscar, portanto, quando nasci. Talvez volte a sê-lo quando morrer. Assino meu nome, por um tempo, Eduardo O C Chaves (sem os pontinhos nas letras do meio). Quando me casei tentei assinar Eduardo O E M C Chaves. Mas dava trabalho demais. Voltei a assinar apenas Eduardo Chaves.

Terei eu uma crise de identidade?

Em São Paulo, 11 de Novembro de 2011. Addaptado de um e-mail de 2 de Junho de 1997.

Meu Pai, Os Pardaillan e Eu

Les Pairdaillans

Logo depois de nos mudarmos de Maringá (PR) para Santo André (SP), o que se deu no início de 1952, meu pai começou a comprar uma série de livros de um autor francês chamado Michel Zévaco (1860-1918). O primeiro livro da série se chamava Os Pardaillan (e foi publicado em 1902). Outros títulos incluíam O Pátio dos Milagres, Epopeia de Amor, Fausta, Fausta Vencida, etc. Todas as histórias, entretanto, giravam em torno do garboso Cavaleiro de Pardaillan e seu intrépido pai, suas lutas (de espada) por justiça, seus amores, e se passavam na atraente e misteriosa França dos séculos XVI-XVII. O nome inicial previsto para a série era Por Ferro e por Amor – “ferro” sendo uma figura de linguagem para “espada”. [Essa figura de linguagem tem um nome, mas eu não me lembro dele].

Sob a influência de meu pai comecei a ler os livros, um por um, e, como meu pai, apaixonei-me por eles. Aprendi muita história da França ali naqueles livros. Trata-se de história romanceada, mas a sequência de fatos históricos nos quais a história é enxertada é sempre real. Por isso, aprende-se história lendo os romances.

Um dia, em 1989, quando estava em Genebra, na Suíça, prestando serviços para a Organização Mundial da Saúde (OMS), que lá tem sede, tive uma folga de uma semana no trabalho e fui para Paris, onde passei uma semana inteira vagabundeando… Lá encontrei, num sebo, na Rue Saint Jacques, perto da Sorbonne, uma cópia do primeiro volume da série, em Francês, usado, até meio surrado. Comprei-o. Eis uma foto dele.

Les Pardaillan - vieux - 2

Em outra ocasião, na mesma semana, em uma das livrarias FNAC (que não existiam no Brasil ainda), que fica em Les Halles, encontrei as obras completas de Michel Zévaco, em três densos volumes da coleção Bouquins (editada por Robert Laffont), que, no total, perfaziam cerca de quatro mil páginas (média de 1.350 páginas por volume). Li o primeiro volume, que eu conhecia melhor, por mais ou menos uma hora, dentro da livraria, e, depois de “provar” (taste) a amostra, não tive dúvidas: comprei a obra, apesar do preço meio salgado. O Francês, em estilo antiquado, especialmente nos diálogos, era delicioso. Ao voltar para casa comecei a ler as histórias que havia lido cerca de 40 anos antes, agora no belíssimo Francês do original. Eis uma foto do primeiro volume da coleção:

Les Pardaillan - nouveau

A edição francesa continha (contém – ainda a tenho) um “Avant Propos” e um longo Prefácio, abrangendo quase 150 paginas, em que a historiadora da literatura popular francesa, Aline Demars (que escreveu sua tese de Doutoramento de Estado na Sorbonne [Paris 4], em 1986, sobre Michel Zévaco, com o título Michel Zévaco et le Roman-Feuilleton), explicava que Zévaco havia sido um dos maiores sucessos literários do fim do século XIX e do início do século XX. Várias pessoas importantes, entre elas Jean-Paul Sartre, admitiam ter sido fascinadas pela obra de Zévaco quando eram crianças e adolescentes. Eu estava, portanto, em boa companhia… (boa no sentido de famosa; como gente e como filósofo não tenho a menor simpatia pelo Sartre – nem pela Simone de Beauvoir, companheira dele, embora goste mais dela do que dele). [No final da década de oitenta, quando trabalhava na Secretaria da Saúde como assessor do Secretário José Aristodemo Pinotti, hoje falecido, descobri durante uma viagem que meu grande amigo Ubiratan D’Ambrósio, também colega na UNICAMP, um pouco mais velho do que eu, também havia sido apaixonado por Les Pardaillan.]

Uma coisa curiosa: em determinado momento, ao ler, numa das historias de Zévaco, que o cavalo de Pardaillan se chamava Galaor, veio-me à memória algo que aparentemente não me ocorrera quando eu lera os livros na década de 50: tive a nítida impressão de que, quando eu era menino, no Paraná, meu pai tivera um cavalo chamado Galaor.

Liguei para o meu pai, então já em seu último ano de vida e lhe perguntei se tivera um dia um cavalo Galaor. A resposta foi positiva. Perguntei-lhe a razão do nome, e a resposta foi a esperada: esse era o nome do cavalo de Pardaillan. Mas como isso era possível, indaguei, se o senhor só veio a ler Zévaco quando veio para  Santo Andre em 1952? Que nada, disse-me ele, em Santo André li tudo pela segunda vez. A primeira vez que li esses livros foi quando era menino, em Patrocínio, MG. Os livros naquela época eram vendidos na forma de folhetim, um pequeno volume a cada poucos dias…

Fiquei surpreso como fato de que um famoso autor popular francês, no inicio do século XX, tivesse seu folhetim semanais traduzido para o Português e que os livretos viessem a ser distribuídos até mesmo no então distante Triângulo Mineiro! Patrocínio é uma metrópole hoje, perto do que era nos anos 1920!

Os Pardaillan, pai e filho, foram uma das poucas coisas em que estavam totalmente de acordo pai e filho.

PS: Escrevi na minha biografia de meu pai um trecho em que ele descreve o Massacre de São Bartolomeu, na França, em 1572. Eis o que eu descobri hoje (11/11/2015), no artigo “Massacre da Noite de São Bartolomeu”, na Wikipedia, em:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Massacre_da_noite_de_São_Bartolomeu/

“História também contada pelo escritor Michel Zévaco (autor francês, nasceu em Ajaccio, em 1860 na mesma cidade de Napoleão Bonaparte, mas cem anos depois, conhecedor profundo da Historia Francesa Medieval e Renascentista) no romance inicial Os Pardaillan, onde ele era mestre em ficção dentro da realidade.” Também do início da Idade Moderna, acrescente-se.

A narrativa da Noite de São Bartolomeu, um domingo, 24 de Agosto de 1572, está no capítulo 40 (XL) de Les Pardaillan.

Escrito não sei quando nem onde (mas faz tempo) — mas transcrito aqui em São Paulo, em 11 de Novembro de 2015.

Aniversário de Quarenta Anos de Ingresso na UNICAMP

Hoje, 1/7/2014, faz quarenta anos que fui contratado pela UNICAMP, mediante proposta da Faculdade de Educação. Eu havia chegado, dias antes (na realidade, em 7/6/1974), dos Estados Unidos, onde vivi por sete anos seguidos e ininterruptos. Meu nome foi sugerido à Diretoria da Faculdade de Educação, que buscava um filósofo da educação, pelo meu primo, Anello Sanvido, que hoje mora no Canadá, mas então fazia Química na Universidade. O Rubem Alves, que eu conhecera quando estudei no Seminário Presbiteriano da UNICAMP, e que já era professor da UNICAMP, no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, apoiou a sugestão do Anello – e isso aparentemente decidiu a questão.

Naquela época, em que a UNICAMP estava se iniciando, e estava longe de ser completamente institucionalizada, havia um procedimento administrativo, chamado “Designação”, mediante o qual o Reitor, Prof. Zeferino Vaz, nomeava a título precário, e enquanto o processo de contratação tramitava pelas diversas comissões e por outros órgãos da burocracia universitária, as indicações de professores feitas pelos Diretores das unidades.

O ofício encaminhando minha indicação foi assinado e levado em mãos, naquela ocasião, pelo Prof. Marconi Freire Montezuma, que respondia pela Direção da Faculdade de Educação, porque a pessoa indicada para exerce-la, o Prof. José Aloísio Aragão, havia falecido pouco tempo antes em acidente de carro.

O Prof. Zeferino Vaz despachou, autorizando a minha designação em nível MS-4 (MS=Magistério Superior do Estado), e encaminhando o ofício à Diretoria da Administração para abertura de processo e envio do processo à CPDIDP – Comissão Permanente de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa.

Enquanto o processo tramitava, lentamente, entrou em efeito, em 15/8/1974, a lei que proibia contratações pelo serviço público por noventa dias antes e depois das eleições de 15/11/1974. Minha contratação formal, por causa disso, só se deu em 8/5 do ano seguinte, mas todos os efeitos foram retroagidos a 1/7/1974. Fui contratado em Tempo Integral (40 horas semanais) e Dedicação Exclusiva. Para isso tive de submeter Plano de Pesquisa à CPDIDP. Meu Plano de Pesquisa versou sobre a questão da Doutrinação, com especial atenção às áreas da Política, Moralidade e Religião.

Assim começou minha vida acadêmica no Brasil. Em 1977 fui promovido para o cargo de professor em nível MS-5 e, em 1980, através de processo seletivo interno, ascendi ao cargo de Professor Titular, no nível MS-6, nível mais alto da carreira docente nas universidades paulistas. Eu tinha 36 anos quando isso aconteceu.

Logo depois de assumir minhas funções docentes, no segundo semestre de 1974, dando um curso de Filosofia da Educação I para as alunas do Curso de Pedagogia, iniciado naquele ano, fui designado pelo Reitor, novamente por indicação do Prof. Montezuma, para exercer a função de Coordenador de Graduação da Faculdade (Curso de Pedagogia). Isso se deu em Setembro de 1974. Em Junho de 1975 foi criado o Curso de Pós-Graduação em Educação – Mestrado da Faculdade, e fui indicado para compor a Comissão de Pós-Graduação da Faculdade, ao lado dos professores Joel Martins e Newton Aquiles von Zuben. Em Fevereiro de 1976 fui indicado Coordenador do Curso de Pós-Graduação e Diretor Associado da Faculdade – fazendo dupla com o Prof. Antonio Muniz de Rezende, que havia sido designado para substituir o Prof. Montezuma, só que agora com o cargo de Diretor da Faculdade (não Responsável pela Direção).

Exerci os dois cargos por um tempo e, depois, deixei o cargo de Coordenador de Pós-Graduação ficando só com Direção Associada da Faculdade, que exerci até Abril de 1980, quando passei a ocupar a Direção, tendo sido escolhido pelo Colegiado (embrião da Congregação), com unanimidade dos dezenove votos. Faziam parte do Colegiado então o Diretor, o Diretor Associado, os três Coordenadores (Pós-Graduação, Graduação-Pedagogia e Graduação-Licenciaturas), os chefes dos cinco Departamentos (Filosofia e História da Educação; Psicologia da Educação; Sociologia da Educação; Administração e Supervisão Educacional; e Didática e Metodologia de Ensino).

Minha indicação pelo Colegiado foi feita em Fevereiro de 1980, porque a Reitoria, então exercida pelo Prof. Plínio Alves de Moraes, estava sendo pressionada por elementos reacionários da administração (o Chefe de Gabinete do Reitor era ex-diretor do DOPS…) a não aprovar a minha indicação. A razão tinha que ver com o fato de que eu, alguns meses antes, enquanto no exercício da Direção (o Prof . Antonio Rezende ficou afastado de suas funções, durante os últimos seis meses de sua gestão, para preparar tese de Livre Docência), havia batalhado pelo retorno do Prof. Paulo Freire ao Brasil, tendo enviado ofício, em nome da Faculdade da Educação, ao Itamaraty, pedindo nova concessão de passaporte ao Prof. Paulo, que estava em Genebra. Essa decisão não caiu bem junto à cúpula da UNICAMP, que me ameaçou até mesmo de demissão, alegando que eu havia quebrado a hierarquia do serviço público, dirigindo-me a um Ministro, algo que apenas o Reitor da universidade poderia fazer.

Para encurtar, o Prof. Plínio conseguiu vencer as pressões e me nomeou, tomando eu posse em 16/4/1980.

Algumas questões mencionadas neste artigo recebem tratamento um pouco mais detalhado no artigo seguinte, que resume a minha gestão como Diretor da Faculdade de Educação (1980-1984).

Transcrito em meu blog “Liberal Space” em Salto, 1 de Julho de 2014.

Transcrito aqui neste blog em São Paulo, 9 de Novembro de 2015.

Já lá se vão 47 anos. . . (Hoje, 52. . .)

Em 1967, quarenta e sete anos atrás, neste dia, então um sábado, eu estava, nesta hora (cerca de 19h) no Aeroporto de Viracopos, em Campinas, acompanhado de minha mãe, de minha tia, e de minhas irmãs, para viajar para os Estados Unidos, onde iria fazer o Mestrado, no  Pittburgh Theological Seminary (http://pts.edu), em Pittsburgh (http://pittsburghpa.gov/), no oeste do estado da Pensilvânia, já quase no estado de Ohio (onde minha filha mais velha mora hoje — de Pittsburgh até a casa dela, em Cortland, são, eu diria, cerca de 100 km, se tanto). Meu pai não foi ao aeroporto — estava sem conversar comigo. Meu irmão creio que não foi — não sei por que razão.

Na época eu estava a menos de três semanas de completar 24 anos (como estou, hoje, de completar 71). Vocês podem conferir a minha foto daquele ano, de um mês antes, por aí, que tirei para o passaporte — o meu primeiro. Estava contente, mas ansioso. O meu Inglês era bastante bom (tinha começado a aprender cedo, havia tido, no Instituto JMC, onde éramos internos, uma namorada que falava Inglês nativo, pois era filha de missionários, e havia completado o curso da União Cultural Brasil-Estados Unidos em Campinas). Mas nunca havia ido aos Estados Unidos e tinha grande expectactiva sobre como iria me sair entre os nativos do país. Depois de uns dias iniciais meio traumáticos, saí-me bem.

Os mais novos vão ficar surpresos de que eu estivesse saindo de Viracopos. Mas a explicação é simples. Naquela época o Aeroporto Internacional de Guarulhos ainda não existia. O Maluf ainda não havia sido nem prefeito nem governador de São Paulo… Cumbica era apenas uma base militar. E o Aeroporto de Congonhas não comportava aviões do porte de um Boeing 707, que eu iria tomar. Voei com a então tradicional PanAmerican World AirWays (PanAm), que, quando fechou, vendeu para a United as suas rotas latinoamericanas. O vôo, se bem me lembro, era PA 202, originado em Montevideo e que chegava a Campinas depois de uma escala em Buenos Aires. O vôo PA 201 fazia a direção contrária, a partir de Nova York. Fizemos uma escala no Rio, no Aeroporto do Galeão (que era um Aeroporto Internacional, além de uma base militar). Do Rio fui direto para Nova York, nonstop, desembarcando no dia seguinte no Aeroporto John Fitzgerald Kennedy (JFK). Este aeroporto havia sido inaugurado em Julho de 1948, com o nome de Idlewild Airport, mas, depois da morte do Presidente Kennedy, em 22 de Novembro de 1963, foi rebatizado em sua honra, na véspera do Natal daquele ano. Do JFK peguei um vôo para Pittsburgh (não me lembro nem da companhia nem do número do vôo, infelizmente), onde me esperava uma família, os Eichleays, com quem iria ficar por uma semana, antes de começarem as aulas.

A estada com os Eichleays (ele se chamava William, do nome da mulher e da filha me esqueço) foi gentileza de uma instituição fantástica, o Pittsburgh Council for International Visitors (PCIV), uma ONG criada para recepcionar e apoiar estrangeiros (visitantes internacionais, no “politicamente correto” de então) que chegassem à cidade. O PCIV era informado pelas universidades e faculdades da cidade quando estudantes ou professores estrangeiros iam chegar à cidade, ou pelas empresas quando os visitantes eram empresários ou seus empregados. Eles então contatavam as pessoas e indagavam, no caso de estudantes, se queriam ficar, por uma semana, com uma família que, voluntariamente, sem receber nada por isso, se dispunha a hospedar o visitante e “aclimata-lo” na cidade. Eu, naturalmente, aceitei. Minhas aulas só iriam começar depois do Dia do Trabalho americano, comemorado na primeira segunda-feira de Setembro. Assim, me dispus a ser hóspede dos Eichleays de 20, domingo, dia de minha chegada, a 27 de Agosto — o domingo seguinte.

Já de início, naquele domingo, levaram-me para um restaurante muito chique. Nunca tinha ido a um restaurante tão bacana. Comi sirloin steak, com legumes. Achei delicioso. Tomei, de aperitivo, dois martinis. Foi a primeira vez que experimentei esse drinque americano. Depois do segundo, senti o efeito e fiquei meio zonzo. Tive um pouco de medo de que eles notassem isso. Mas se notaram, foram delicados o suficiente para não me deixar perceber. Com a comida, o impacto passou. De sobremesa, experimentei (também pela primeira vez) cheese cake. Achei delicioso.

Depois do almoço, deram-me uma tournée da cidade, que achei linda. Pittsburgh é cortada por dois rios, o Allegheny e o Monangahela, que se unem, no centro da cidade, para formar o rio Ohio. A cidade era conhecida, nos anos 30, como “Dust City” (Cidade da Poeira), por causa da poluição causada pelas inúmeras indústrias que tinham sede na cidade, em especial várias indústrias do aço, das quais a US Steel, criada por Andrew Carneggie, o homem mais rico do mundo na passagem do século 19 para o 20, era a principal. Pittsburgh era sede de várias universidades, das quais as principais eram a University of Pittburgh – Pitt (vide http://pitt.edu), a Carneggie-Mellon University (vide http://cmu.edu), tecnológica, que, quando cheguei lá, era chamada de Carneggie Institute of Technology, e a Duquesne University (http://duq.edu),  católica. Era sede de três times esportivos profissionais: os Pittsburgh Steelers, de futebol americano (http://www.steelers.com/), os Pittsburgh Pirates, de beisebol (http://pirates.com), e os Pittsburgh Penguins, de hóquei sobre o gelo (http://penguins.nhl.com/). Os Steelers nunca haviam ganho um superbowl. Desde então ganharam seis, sendo o time que mais vezes foi campeão americano. Os Pirates haviam sido campeões mundiais (como eles chamam os campeões americanos) em 1960 e vieram a ser novamente em 1970, quando eu ainda estava lá. Os Penguins foram formados em 1967, e, portanto, não haviam ganho nada ainda quando cheguei lá, mas, depois, foram campeões nacionais três vezes, em 1991, 1992 e 2009. O time de futebol americano universitário da Pitt eram os Panthers, que era ruim quando eu estava lá, mas melhorou muito, sem, contudo, jamais chegar a ficar por muito tempo entre os melhores. A cidade tinha uma fantástica Orquestra Sinfônica (http://www.pittsburghsymphony.org/pso_home). O PCIV dava, semanalmente, bilhetes para jogos e concertos para os estrangeiros da cidade, numa base primeiro a chegar, leva. Como a sede do PCIV era dentro da Pitt, onde eu fiz o doutorado, de 1970 a 1972 eu aproveitei o fato para não perder muitos jogos. Infelizmente, não aproveitei igualmente os concertos.

Pittsburgh era também uma cidade famosa por suas faculdades de medicina e hospitais. O hospital mais famoso era o Presbyterian University Hospital, que faz parte do University of Pittsburgh Medical Centers como seu principal hospital de clínicas. Ele fica ao lado do estádio dos Panthers, dentro do campus.

O campus tinha dois prédios célebres. A Cathedral of Learning (Catedral da Aprendizagem), de 38 andares, no centro do campus, que era, naturalmente, uma catedral secular (http://www.nationalityrooms.pitt.edu/about/cathedral-learning), e a Heinz Memorial Chapel (http://www.heinzchapel.pitt.edu/), que funcionava como a igreja não-denominacional do campus, tendo sido construída com recursos doados pelo famoso industrial H. J. Heinz (fabricante de ketchup e mostarda). A empresa dele (vide http://en.wikipedia.org/wiki/H._J._Heinz_Company) é hoje parte do império do suíço-brasileiro Jorge Paulo Lemann e seus sócios.

Enfim, é isso.

Fiquei em Pittsburgh cinco anos, de 20 de Agosto de 1967 até 20 de Agosto de 1972, quando me mudei para a California, onde arrumei um emprego em Hayward, na Baía de San Francisco.

Comemoro a data 19 de Agosto todo ano e sou grato a todos os que viabilizaram a oportunidade que tive de estudar nos Estados Unidos. Foi um privilégio. Cito, em especial, o Rev. Gordon E. Jackson, Deão do Seminário Presbiteriano de Pittsburgh, que me convidou para ir para lá e me deu a bolsa que me permitiu ficar lá durante cinco anos, e o Rev. Aharon Sapsezian, então Secretário Executivo da Associação de Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE), aqui de São Paulo, que em 1967 me deu a passagem para ir e voltar. O Aharon virou, em 1987, um de meus mais diletos amigos. Ele faleceu recentemente. Com o Rev. Jackson perdi contato, mas imagino que já tenha falecido.

Transcrito em meu blog “Liberal Space” em São Paulo, 19 de Agosto de 2014.

Transcrito aqui neste blog em 9 de Novembro de 2015.

Levemente revisado em 16 de Dezembro de 2019.

50 Anos Atrás (Hoje 56…)

Estou lendo uma biografia de Rudolf Karl Bultmann. O título é Rudolf Bultmann: A Biography, e o autor é Konrad Hammamm. Estou lendo em um ebook comprado da Amazon Kindle.

Li Bultmann pela primeira vez há 50 anos. Escrevo em 2014. Em 1964 fui para o Seminário Presbiteriano de Campinas e lá fui apresentado a Bultmann. Não pelos professores: Bultmann era muito avançado e radical para eles. Foram os colegas que me apresentaram Bultmann: Waldir Berndt e Elias Abrahão, colegas com os quais convivi também em Pittsburgh, a partir de 1967… Principalmente eles. Foi o contato com Bultmann que começou a desestruturar a fé simples, não-refletida, ingênua, que eu havia trazido comigo para o seminário. Uma fé que se contentava consigo mesma, que se bastava a si mesma, que não buscava, como um dia sugeriu Santo Anselmo, o entendimento. Uma fé sem entender, que cria mesmo naquilo que não entendia. Não chegou a ser uma fé como a de Tertuliano, que afirmava crer porque era absurdo, mas chegou perto.

O que os colegas me falavam sobre Bultmann despertou minha curiosidade. Acabei comprando um livro, em dois volumes, chamado Kerygma and Myth (A Proclamação Evangélica e o Mito), editado por Hans Werner Bartsch, que começava com um artigo de Bultmann, com o título “The New Testament and Mythology” (“O Novo Testamento e a Mitologia”) e trazia uma série de artigos que discutiam o artigo programático de Bultmann.

Comecei a ler — e fiquei abalado. Verdadeiramente abalado. Fiquei em dúvida se deveria continuar lendo. Eu tinha apenas 20 anos, mas sabia que seria arriscado. Aquilo que eu já havia lido falava sobre questões acerca das quais eu nunca havia pensado, em minha santa ingenuidade de primeiro anista de seminário. Mas eu imediatamente percebi que o artigo de Bultmann era nitroglicerina pura. Se eu optasse por continuar a lê-lo, sabia que minha fé correria risco. Mas parar de ler não era mais uma opção. Li, então, até o fim. Era longo.

Recentemente li uma biografia de Billy Graham que ele tinha um amigo que foi estudar teologia em um outro seminário, mais liberal do que aquele em que ele, Graham, estudava. Nos fins de semana, eles se encontravam, e o amigo lhe relatava tudo o que havia lido e ouvido. Chegou um dia em que Graham pôs uns fins a esses encontros, porque percebeu que ele corria risco de perder a fé se os encontros tivessem continuidade.

Eu não fiz isso. Na verdade, resolvi traduzir o artigo para o Português, o que fiz ao longo do meu segundo ano de seminário, em 1965. O Setor de Apostilas do Centro Acadêmico “Oito de Setembro” (CAOS) publicou a tradução em apostila — usando estênceis (não sei se o termo stencils se traduz assim), daqueles velhos, encerados, e um mimeógrafo que era propriedade do CAOS. Eu mesmo digitei (datilografei) o texto nos estênceis. Publicado, interna corporis, sem pedir permissão a ninguém, o artigo causou furor. Ajudou preparar a crise do ano seguinte, 1966.

O que mais me causava surpresa no artigo de  Bultmann era o seguinte. Se ele tivesse sido escrito por um ateu, o impacto em mim não teria sido tão grande. De um ateu você normalmente não espera grande coisa (pelo menos assim pensava eu em 1964). Na verdade, você até mesmo espera que ele critique sua religião. Mas Bultmann era “crente”. Mais do que isso: era pastor luterano – e teólogo, um dos mais famosos do mundo protestante, professor de teologia numa das mais conceituadas universidades mundiais: Marburg, na Alemanha. Havia livro com sermões dele… O exemplo dele falou tanto quanto seu artigo. Levou-me a crer que era possível defender as ideias que Bultmann defendia no artigo e continuar a ser crente, pastor, teólogo, professor de teologia (como eu pretendia vir a ser… — e, no último caso (professor de teologia), um dia, 50 anos depois, acabei sendo, na Faculdade de Teologia de São Paulo (FATIPI) da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (IPIB), em Julho de 1974.

Talvez eu mantivesse, ao acreditar nisso, um pouco da minha ingenuidade. Quem sabe era possível acreditar naquilo que Bultmann dizia e continuar a ser crente e pastor na Alemanha, país avançado… Mas, na Igreja Presbiteriana do Brasil, não seria. E não foi. Fui defenestrado do seminário em 1966. Em parte por causa de minha propaganda das ideias bultmannianas.

Mas fui parar, intermediariamente, na Faculdade de Teologia da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), em São Leopoldo. Lá vi que luteranos se entendem. Bultmann lá não era escândalo: era normal. Aos poucos eu comecei a conviver com as ideias de Bultmann como se fosse normal olhar para a Bíblia, Jesus Cristo, a sua apregoada ressurreição, e o Cristianismo daquele jeito… Mais para o final de 1967 fui para o Pittsburgh Theological Seminary, também presbiteriano, mas onde ler Bultmann, como em São Leopoldo, também era natural — embora aceitar suas teses nem tanto. Mas lá não havia o clima inquisitorial que existia na Igreja Presbiteriana do Brasil e no Seminário Presbiteriano de Campinas.

Começou em 1967 o meu exílio da fé, que durou ao redor de 43 anos, de 1967 a 2010.

Agora estou aqui, de volta, lendo uma biografia de Bultmann, 50 anos depois de tudo ter começado. Descubro, na biografia, que ele também enfrentou problemas por causa de suas ideias. Sofreu oposição. Universidades, como a de Leipzig, o convidaram para se transferir para seu Departamento de Teologia, como professor e parte do corpo docente, apenas para, depois, retirar o convite por pressão da Igreja Luterana… a mesma que, em grande medida, apoiou, logo depois, Hitler e o Nacional Socialismo. Senti-me mais irmanado a Bultmann ao descobrir isso. A igreja luterana alemã apoiou, em grande medida, o Nazismo — e a igreja presbiteriana brasileira apoiou, em grande medida, a Ditadura Militar brasileira…

Os livros de e sobre Bultmann que comprei nos anos 60 e 70 do século passado — são uns cinquenta — ainda os possuo, todos eles: nunca achei que devia me livrar deles. Eles eram — e continuam sendo — parte de mim. Dispor deles era como me livrar de um pedaço de mim. Não do meu corpo, mas da minha alma. As ideias deles entraram pelo meu sistema de ideias, foram mastigadas, algumas mal, outras melhor, mas foram todas de alguma forma digeridas, e, depois, algumas ficaram no sistema, outras foram excretadas, mas as que ficaram se misturaram com o que já estava no meu sistema e passaram a fazer parte de mim, parte do meu DNA. . . Essa metáfora tomei emprestado do Rubem Alves.

Bultmann morreu em Julho de 1976, quando eu já era Diretor Associado da Faculdade de Educação da UNICAMP e pensava que havia deixado a teologia definitivamente para trás. Mais um engano meu. Um autoengano.

Artigo publicado em meu blog Liberal Space, em Salto, 23 de Agosto de 2014, poucas semanas depois de eu começar a dar aula de História da Igreja e de Teologia Histórica (História do Pensamento Cristão) na FATIPI. Fiquei lá durante três anos, saindo depois que me mudei de São Paulo para Salto. Transcrito aqui neste blog em São Paulo, 9 de Novembro de 2015. Revisto aqui neste blog em São Paulo, 16 de Dezembro de 2019, 55 anos depois dos fatos que descrevo. E revisto de novo, em 13 de Dezembro de 2020, um ano depois, ou seja, 56.